Gustavo deixou que ela se acalmasse, depois perguntou se podia continuar. Bianca balançou a cabeça em afirmativo e ele falou:
- Eu acho que foi aí que eles romperam. Quando Enzo matou Valentina, entregou a faca e o queijo nas mãos de Lorenzo, para que ele se aproximasse de seu pai. A partir daí a guerra dos dois começou, pra ver quem ia rouba-lo primeiro.
- E eu acho que Enzo foi mais esperto.

- Como assim?
- Algo me diz que Lorenzo não planejou tudo isso. O plano de Lorenzo era apenas se aproximar do meu pai e usar Enrico quando e se fosse necessário. Ele cria Enrico muito bem, como se fosse filho dele mesmo. A relação que vejo nos dois, não é de alguém que está usando Enrico. Talvez se afeiçoou ao menino. Talvez o plano dele fosse apenas fazer meu pai passar tudo pra ele de bom grado.
- E estava conseguindo. Seu pai o adorava.
- Até Enzo dizer pra ele que Lorenzo quem matou Valentina.
- E mostrar o vídeo da infecção.
- Você vê Lorenzo produzindo provas de seus crimes?

- Claro que não! Ele é esperto demais.
- Então ou ele não envenenou meu pai, ou Enzo sabia e não impediu
- Então você está correndo risco duplo agora.
- Qual a intenção de ele fazer esse estardalhaço todo em volta do meu casamento?

- Isso eu sei. Ele só te contou metade do plano. A idéia é mesmo trazer a máfia pra testemunhar o crime de Lorenzo. Mas ele espera que Lorenzo não va se entregar sem lutar.
- E nesse interim, ele me mata depois é capturado.
- Seus bens passam todos para Enzo e ele mata dois coelhos numa cajadada. Se livra de você e de Lorenzo, não precisa matar seus herdeiros, porque seu pai deu poderes a ele, e volta para a Itália como o Dom que pegou um traidor e tentou salvar a pátria.
- Filho da putä. E agora, o que eu faço?
- Eu tenho um plano. Arriscado. Muito arriscado. Principalmente pra Aisha.
- O que?
- Você vai seguir o baile. Vamos voltar para o Brasil no tempo, você vai continuar com a ideia de casamento. Eu vou arrumar um jeito de fingir sua morte.
- O que você tá falando aí?
- Bianca, você é uma princesinha criada com toda pompa e proteção por um filho da máfia!
- Isso mesmo. Da máfia! Nem eu e nem você sabemos o que é isso. Você pode ter descoberto um plano por trás do plano que eu, nem Thales vimos, mas isso não te dá PhD em máfia. Eles são ruins, são piores do que eu sequer imaginei. E tudo o que se lê nos livros ou vê em filmes é verdadeiro.
- Bianca, respira. Eu sei que você está assustada e eu também estou. Mas quando descobrimos a fraude, te falei que estaria com você, protegendo o patrimônio do meu filho. Agora, eu reforço. Estarei lado a lado com você para proteger sua vida e a vida dele. E principalmente da dona Amélia pra poder pedir a sua mão em casamento, como deveria ter sido desde o começo.
- Eu sei que sua intenção é boa, Gu. Mas não estamos preparados para enfrentar algo assim.
- Você não está. Mas você se esqueceu que eu vivi nas favelas de São Paulo e nos cabarés de Minas? Você não teria noção das coisas ruins que eu vi que os donos da quebrada são capazes de fazer. Nem do que leões de chácara são obrigados para proteger as meninas de clientes cruéis. Confia em mim, por favor. E você vai se surpreender em como eu posso te proteger.
- Está bem. O que eu faço?
- Você começa ligando pra Aisha vir pra cá depois do baile.
- Você está louco? São 4 horas da manhã. A menina deve estar dormindo
- A sua inocência é uma delícia, minha Bianca. Aisha tem 15 anos, está de férias, com a turma de adolescente irresponsáveis no baile de formatura! Com certeza ela está rebolando a jaca...
Bianca estreitou os olhos pra ele. Era uma forma de ela se certificar de que ele sabia do que estava falando. Estava confusa, sem saber o que pensar. Pra ela, enfrentando tudo sozinha, achou que em breve tudo estaria resolvido. E no fim, Gustavo a alertou de que estava entrando num problema maior.
Mas daí a deixar seu contador engomadinho armar um plano em seis dias para enfrentar dois mafiosos ruins , era um passo muito grande.
Ela não entendia de crimes, máfia, gangs, "dono de quebrada" seja lá o que isso significa. Mas pensava rápido e sabia avaliar uma situação. E avaliando a situação dela, sabia que estava ferrada.
Pegou o celular e ligou pra Aisha, que atendeu no segundo toque com som alto.
- Bianca, aconteceu alguma coisa?
- Não. Seu pai pediu pra quando você terminar o baile, vir até o hotel na suíte dele.
- Está bem. estarei aí em uma hora. Já cansei daqui. Vou só me despedir do pessoal. Até já.
Bianca se surpreendeu e muito com a naturalidade da conversa. Ela não se desculpou ou pareceu culpada. Pra Aisha era completamente normal estar num baile as 4 da manhã sem um responsável!
- O que foi, está encucada com a naturalidade da situação? Você foi criada de maneira retrógrada, Bianca. Tanto que levou tanto tempo pra criar a coragem de perder a virgindade com seu namorado fixo de anos. Os adolescentes de hoje não são mais criados assim, eles ganham a liberdade com limitações, e quando fazem por merecer. Isso em famílias de classe média pra cima. Nas famílias de classe baixa, nas favelas, eles são libertos por vontade própria mesmo muito mais cedo. E esses mais rebeldes, que com 13 ou 14 anos estão acompanhando os bondes, com meninas dançando peladas músicas que na maioria das vezes nem entendem o significado, acabam como a Mariane ou grávidas antes dos 15.
- Está bem, você está familiarizado com os déficits das comunidades mais carentes. Já entendi. Não tenho escolha a não ser seguir seu plano, que ainda não sei qual é. Pra começar, o que você quer com Aisha?
- Vou contar toda a história pra ela, vou avisar que vou colocá-la em risco extremo e que você vai sozinha com ela na viagem.
- Não, não e não. Você não vai arriscar mais ninguém história! E como assim você não vai viajar? Eu também não vou.
- Bianca, eu preciso que a história fique muito real pra eles, e só vou conseguir isso colocando Aisha no fogo. E depois, eu preciso de tempo e preciso que você e ela estejam seguras nesse tempo. Por favor, você disse que ia aceitar.
- Gustavo, estou com medo. Não suporto perder mais nada. E outra coisa. Eu e Aisha vamos estar segura nesses dias, mas Gabriel, Enrico e você?
- Não se preocupe. Com o que vou fazer, Gabriel, você e sua mãe vão ficar em segurança pra sempre. Enrico vai se tornar desnecessário, e só eu e Aisha vamos ficar na mira.
- Não posso permitir isso, Gustavo. Você colocar sua família em risco pra salvar a minha.
- Aisha e eu não somos sua família?
- São. Eu os amo, e você entendeu o que eu quis dizer.
- Então fique calma. O que parece mais arriscado, é o que vai dar certo.
- Está bem, vou confiar em você. Não tenho outra saída.
Bianca o abraçou e ele ficou fazendo carinho em sua cabeça, até a batida na porta de Aisha.