Capítulo 26
1531palavras
2023-03-11 21:18
Bianca estava com um coque frouxo, de calça legging e top de academia, olhando seu closet tentando decidir o que deveria usar para o jantar com Lorenzo. Tirou vários modelos e desistiu. Percebeu o quão informal ele era por se recusar a ir trabalhar de terno e gravata. Ela ouviu ele falando pra alguém que já tinha que estar de terno com os clientes e no tribunal. De resto ele se vestiria como queria.
Então, se ele não queria formalidades no escritório, quem dirá num jantar simples, em casa, no meio de semana. Mas também não poderia estar muito a vontade, pois ele entenderia que ela não respeitou a importância que ele tinha para o pai e para o escritório.
Olhou seu relógio de pulso. Uma relíquia de valor emocional inestimável que seu pai lhe deu quando fez 15 anos. Quase nunca tirava. Era como se fosse uma aliança que usasse com o pai. Faltava 35 min pra hora combinada. Já tinha passado na cozinha e conferido que estava tudo em ordem. Tomou um banho e resolveu colocar uma legging e top pra ligar para Gabriel antes de se vestir. Depois que brincou com o filho, falou com a mãe sobre o jantar e ela ficou extremamente animada. Disse que os dois teriam muito o que conversar, já que cada um tinha suas adorações pelo Maurício.

Ouviu a campainha e franziu a testa. Ninguém tinha vindo avisá-la de alguém na recepção do condomínio, então quem estava lá tinha livre acesso, pois quando o interfone tocava lá embaixo, sua câmera de segurança acionava. Olhou no relógio novamente, disposta a despachar quem quer que fosse. Tinha tido uma ideia e o visitante inoportuno poderia estragar seus planos. Ela pretendia ficar exatamente daquele jeito até que pudesse ver como ele estaria vestido pelas câmeras, e aí se vestir enquanto ele entrava. Tinha se achado um gênio, mas não contava com um visitante sem anúncio.
Quando desceu as escadas , ficou boquiaberta e quase correu escada acima de volta. Lorenzo estava de pé em sua sala, próximo a entrada conversando com Magda, sua assistente do lar. Pareciam velhos amigos, e ele segurava sua mão. Quando se virou para subir novamente para se vestir, ele a chamou.
- Era exatamente o que eu queria chegando mais cedo, Bianca.
Bianca parou com um pé no primeiro degrau, estremeceu com a voz de trovão dele, e foi se virando, muito vermelha por estar totalmente desarrumada.
-Não entendi...
- Vocês mulheres têm o péssimo hábito de ficarem horas olhando o closet com 300 peças variadas e dizer que "não tem o que vestir". Decidi que ia lhe poupar essa perca de tempo e te pegar com as roupas que você costuma ficar no conforto de sua casa.

- Obrigada, Magda. Pode ir verificar a cozinha pra mim? - Bianca dispensou a ajudante e aguardou ela dar um beijo em Lorenzo e se encaminhar para a cozinha, depois se virou pra ele - Perspicaz e gentil, mas atrevido e quebrando todos os protocolos de etiqueta. E se eu tivesse nua? Como você entrou sem ser anunciado?
- Se você tivesse nua eu me preocuparia de você andando assim na frente dos empregados e atendendo a porta. - Lorenzo deu uma piscadinha pra ela e a seguiu até o sofá - Eu não preciso ser anunciado pra entrar no meu condomínio...
- Você mora aqui? - Bianca perguntou totalmente incrédula.
- Não. Tenho uma casa aqui também. Mas moro com Enrico em Valinhos.

- Nossa, apesar de não muito longe, é no interior. Você dirige o que? Uma hora e meia pra chegar no escritório?
- Por aí. Mas sempre fiz essa viagem pelo menos uma vez por semana para atender em meu escritório em São Paulo. Não estou fazendo nenhum sacrifício pelo cargo que ocupo agora.
A conversa fluiu bem entre os dois, Lorenzo contou várias histórias que viveu com seus pais, casos que defendeu com o Dr. Maurício. Falou bastante a parte técnica do caso dele que seu pai defendeu. Os dois concordaram que sempre era bom revisitar esse caso a título de aprendizagem.
Lorenzo contou a Bianca detalhes que ninguém poderia saber, e ela se sentiu muito grata por isso. Ela poderia tentar imaginar o que ele ele passou, mas nunca saberia. E de repente, sentiu que seus traumas não eram nada comparado aos dele. Mas ele não era amargo, pelo contrário, era sorridente, alegre, bem humorado. Sempre tinha uma piada ou uma gracinha pra fazer.
Quando Magda colocou o jantar, Bianca insistiu que ela se sentasse com eles. Parecia que ela tinha um carinho especial por ele. Bianca se perguntou onde estava enquanto todos aproveitavam da companhia de uma pessoa tão agradável, mas que ela só se lembrava de ter ouvido falar do caso dele.
Com uma pontada de amargor, pensou que deveria estar absorta em sua depressão de pobre menina rica e depois com Gustavo. Também pensou que nos momentos que estava mais fechada em si mesma e em seu relacionamento, Lorenzo quem fez companhia para seus pais e foi tratado como filho. Deveria sentir ciúmes disso, mas ao contrário, se sentia grata pelo papel de Lorenzo na vida de seus pais e por ele dividir isso com ela naquele momento.
Depois de comerem, foram pra sala conversar e Lorenzo segurou em seu queixo, olhando em seus olhos.
- Quero te contar uma coisa, mas não sei se você está preparada.
- Algum segredo absurdo de meus pais? - Bianca ironizou o momento pra esconder o quanto o toque dele mexeu com ela. Por mais apaixonada que tenha sido por Gustavo, entendia que era uma menina com sua primeira experiência, e nunca tinha sentido aquilo por homem nenhum. Não era só desejo, apesar de Lorenzo ser um homão da poha que despertava nela seus instintos mais loucos. Sabia que ele era um homem, completo, com seus traumas e bagagens, mas ainda assim um encanto. E ela sentia vontade de ser abraçada, confortada, cuidada. Não mimada como sempre foi por seus pais, Magda, Thales e até Gustavo. Mas cuidada, como uma mulher que precisava ser amada. E estava envergonhada de ter esse desejo por um homem que acabava de conhecer.
- Não é bem um segredo. Você até já sabe, apenas não fez ligação. - Lorenzo viu a cara de espanto que ela fez e tratou de continuar - Bianca, se lembra em qual cidade seus pais sofreram o acidente que você acabou descobrindo sobre o câncer?
Bianca primeiro se perguntou porque ele estaria falando sobre esse período nebuloso da vida dela, mas quando compreendeu, seu corpo todo enrijeceu e apenas disse, quase num sussurro:
- Valinhos...
- Sim, eles estavam indo me encontrar, como já fazíamos há alguns meses desde que seu pai descobriu o tumor.
- Claro, você sempre soube do tumor. Porque passaram a se encontrar com maior frequência?
- Nunca passei uma semana sem ver seu pai, Bianca. Apenas que em Valinhos tem a Neo Onco, clínica referência em oncologia. E dona Amália e eu o convencemos a tentar pelo menos. Ele já estava fazendo acompanhamento com a doutora Alice Helena, e ela quem o aconselhou a procurar tratamento na América do Norte, que lá era o único lugar que ele poderia fazer aquela cirurgia arriscada. Ela o avisou de que seu tempo estava ficando cada vez mais apertado, mas ele queria amarrar todas as pontas soltas.
- E quais pontas soltas meu pai teria pra não se cuidar?
- Eu sempre imaginei que você teria mágoas dele por isso. E por mais um monte de coisas.
- O que por exemplo?
- Posso te contar na sexta enquanto dirijo pra casa pra voce conhecer o Enrico. O que acha?
- Excelente ideia, mas vai me deixar curiosa por 4 dias?
- Tecnicamente são três, pq já é terça. Mas eu te dou uma palhinha todos os dias no almoço, pode ser?
- Meu Deus, já passa da meia noite. Isso quer dizer que você já está acordado há mais de 20 horas!
- Sim, e gostaria de descansar, se não se importa.
- Mas é claro, meu Deus, que incoveniente! Quer dormir aqui? Peço para Magda preparar um quarto...
- Tenho uma casa há uns 15 min daqui, Bianca.
- Mas lá tem a Magda pra lhe preparar café da manhã?
- As panquecas que a Magda faz são as melhores do mundo. Tenho saudades...
- Então fique, vou pedir para ela providenciar um pijama de papai para você dormir e amanhã cedo você pode ir se trocar e podemos ir juntos para o escritório.
- Não podemos, desculpe. Já não fui pra casa hoje e tenho um filho adolescente. Preciso estar com ele amanhã, então vou dirigir do escritório pra ele e não posso te trazer.
- Eu tenho motorista, sabia?
- Mas seria totalmente deselegante tirar uma mulher de casa e não trazê-la depois...
- Em que século você vive?
- Tá, isso doeu...
Os dois riram, Magda entrou avisando que o quarto dele já estava pronto e eles se recolheram.
Bianca foi dormir exausta com um sorriso bobo. Não sabia dizer em quanto tempo não se sentia tão bem...