Capítulo 15
985palavras
2023-01-07 08:00
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Meu coração já tem dona
Um mês depois, exatamente, Roberta me procurou. Nesse meio tempo nos encontrávamos frequentemente na empresa onde eu trabalhava com o painho, a qual ela era herdeira, mas não nos falávamos. Ela me evitou a todo custo. Como se não bastasse o silêncio de Charlote, que nem capaz de me ofender foi, eu tinha que lidar também com o desprezo de Roberta.

Muitas vezes me peguei com vontade de procurar Charlote e dizer a ela o quanto sentia sua falta. O quanto eu estava sendo estúpido por mantê-la distante, mas depois de muito resisti eu desistia. Então lembrava de Roberta e me questionava se estava realmente fazendo o que era o certo. Eu me sentia incapaz de esquecer a Charlote, apesar da distância, apesar de todo o esforço. Então tomei uma decisão.
Ela estava parada no meio da sala da minha casa, olhando para mim sem saber por onde começar. Então tomei a iniciativa.
— Quer chá?
Que diacho! Eu nem estava tomando chá e nem ao menos tinha chá na minha casa. O que eu estou fazendo?
— Não, obrigada! – Ela respondeu sorrindo. É, eu estava sendo um idiota.
— Painho fez café – continuei – eu não tomo café, mas sei que você gosta, então eu pensei…

No meio da frase minha voz foi murchando ao ponto de quase desaparecer. Eu nem sabia ao certo o que estava fazendo, mas sabia como eu queria que aquela conversa terminasse.
— Senti falta…
— Do café? – Perguntei antes dela terminar a frase – e olha que painho anda fazendo um café aguado, que só a pulso para tomar.
— Senti falta de você.

Ela completou a frase e eu prendi a respiração involuntariamente. Mas eu não a respondi, nem ao menos sabia que expressão eu tinha no rosto. Fiquei meio azuretado.
— Lamento mesmo que você não tenha sentido a minha – continuou – durante esses dias não me procurou. Nem um telefonema, absolutamente nada.
— Está enganada – foi tudo que consegui dizer.
Cabra frouxa da merda. É isso que eu sou.
— Enganada sobre o que? – Perguntou – sobre você senti minha falta ou por eu ser uma boba?
— Você não listou essa parte de ser uma boba – falei – mas se tivesse eu poderia considerá-lo.
Ela riu. Eu adorava quando ela ria. Mas odiaria magoá-la novamente.
— Eu senti muito a sua falta – continuei – e estou sendo sincero, mas se eu te procurasse seria desrespeitoso com os seus sentimentos, com o seu tempo e com o meu também.
— O que você quer dizer com isso?
— Eu menti para você – engoli a seco – não só para você, mas para Charlote e para mim mesmo também, e não quero continuar com isso.
Eu vi um brilho triste invadir o olhar dela assim que ela concluiu a frase e por um momento eu pensei em desistir só para não a magoar mais uma vez.
— Eu estava disposto a seguir minha vida longe da Charlote e perto de você. Eu fui imaturo e irresponsável quando pensei que estando ao seu lado esqueceria ela. Falhei miseravelmente e não posso cometer o mesmo erro.
— Achei que sairia inteira dessa conversa – ela passou os dedos sobre os olhos enxugando as lágrimas e eu quase chorei junto com ela – me enganei. Já pode considerar a opção de ser eu uma boba, porque eu sou.
— Oxente! – Me aproximei dela, perto demais – Não é assim que eu quero que você se sinta. O único abestalhado aqui sou eu, visse – consegui fazer ela rir – Eu gosto muito de você, acredite. É a boyzinha mais linda que eu conheci aqui em sampa. Mas eu não posso continuar ao seu lado se o meu coração não estiver junto. Se for, que seja por completo.
— Esse é o lado que eu mais amo em você – disse emocionada – Charlote é uma garota de muita sorte por ter o seu amor.
— Ah, tenho que concordar, visse!
— Esse seu lado convencido eu não conhecia.
— Tem muito sobre mim que você não conhece – passei a mão sobre o seu rosto – o que não significa que esse é o fim. Consideraremos uma pausa até acharmos que podemos continuar, com segurança.
— Podemos sim – me espantei com a rapidez daquela resposta – o que significa, com certeza, que eu não vou desistir de você assim tão fácil. Sem Charlote, só eu e você. Eu te espero o tempo que precisar, visse?
Sorri para ela, ou melhor, lhe mostrei meus belos dentes, e ela devolveu o agrado. Nos abraçamos e meu coração partiu pela segunda vez naquele dia. Eu até parecia um cabra frouxo desistindo assim de uma moça tão bela como Roberta, mas eu não podia continuar enganando-a. Meu coração já tinha dona, mesmo que eu constantemente a expulsasse de lá. Charlote insistia em ficar, como o seu tamanho GG ocupando todo o espaço. Eu podia usar Roberta para esquecê-la, mas não seria tão canalha assim. Eu tinha certeza de que um amor como aquele não seria substituído assim tão facilmente.
Então ela perguntou de Charlote; se eu voltaria para Noronha; se eu a procuraria novamente. E para todas as perguntas minha resposta foi não. Eu tinha tomado a decisão de ficar em São Paulo e resolver minha vida por ali mesmo. Charlote, nem Noronha estava nos meus planos, e de certa forma ouvir aquela confissão fez Roberta resplandecer novamente.
E assim foi por muitos anos. Trabalhávamos juntos. Criamos um laço forte de amizade e companheirismo. Rolava uns beijos aqui outro ali, mas nenhum compromisso sério. Eu não queria compromissos sérios, nem com Roberta nem com ninguém. Mesmo que eu e Charlote já não nos falássemos mais ela continuava viva em meus pensamentos. Inevitavelmente também em meu coração.