Capítulo 13
2069palavras
2023-01-05 20:20
1
A confusão com Roberta
Eu fiquei uma semana esperando uma resposta de Charlote. Qualquer coisa, um adeus, uma bronca, um xingamento. Uma palavra qualquer que me fizesse seguir em frente, tocar a vida, mesmo que doesse saber que, a cada passo dado, ela ficaria cada vez mais distante de mim. Mas Charlote não me respondeu, visualizou a mensagem e o silêncio foi tudo o que ela me ofereceu.
Um dia desses entrei no Facebook, porque a saudade dela estava acochando o meu coração, e avalie só o tamanho do susto que eu tomei, Charlote havia me bloqueado. Roberta também me questionou do porquê de não ter postado no Facebook que estávamos namorando e eu inventei diversas desculpas. Na verdade, eu não queria que Charlote soubesse, não daquele jeito. Agora que ela havia me bloqueado eu poderia contar a todos que eu estava de chamego com a morena mais linda de São Paulo.
Um dia desses, depois do trabalho, cheguei em casa e Roberta estava lá me esperando e o que eu temia aconteceu:
— Allan, meu filho – mainha passava um café – você tem tido notícias de Charlote?
Eu gelei. Que diacho que mainha inventou de falar de Charlote na frente da Roberta.
— Não tenho notícias não mainha – engoli em seco – mas quando esse café sai mesmo?
Tentei mudar de assunto.
— Oxê! Como não tem? – Ela insistiu – Quando morávamos em Noronha você e Charlote viviam grudados o tempo inteiro e agora que se mudou não fala mais com ela?
Eu queria responder, se fosse possível até mesmo contar a verdade só para encerrar de vez aquele assunto, anulando assim qualquer curiosidade de Roberta sobre o tema. Tarde demais.
— Quem é Charlote?
— Uma amiga – falei rápido – amiga de infância do tempo do colégio.
— A pois! – Mainha sorriu, de um jeito malicioso, que eu até me assustei – se nós tivéssemos ficado por lá, hoje os dois estariam de chamego, visse. Charlote arriava os pneus por Allan.
Fudeu a tabaca de chola, eu pensei. Olhei para a Roberta que já me observava desconfiada e furiosa.
— Mainha está exagerando.
Fui até a pia, enchi a xícara de café e tentei disfarçar.
— Eu gostaria muito de ouvir mais sobre isso – Roberta disse – Me conte mais sobre a Charlote, Allan.
O café desceu rasgando.
— Contar o que? – Mainha me fez comer brocha – Charlote é passado, assim como todos que ficaram em Fernando de Noronha.
— Que história é essa de passado, menino? – Mainha a cada palavra, complicava mais minha situação – até o tempo desses você estava conversando com Charlote. Tem dias que passa horas naquele troço de computador só por causa dela Oxente, Allan! – Ela pôs a mão na cintura e eu fiquei no meio das duas me questionando – Seu pai pediu para que você entre em contado com Charlote para saber como estão as coisas por lá. Ainda não recebemos o aluguel da casa e precisamos que seu Chico vá lá cobrar.
Mainha se retirou da cozinha me deixando na situação mais complicada da minha vida. Eu não sabia o que fazer. Se contasse a verdade colocaria em jogo meu namoro, mas se mentisse poderia piorar muito mais as coisas.
— Então você passa horas conversando com a Charlote, Allan? – Ela me fuzilou com o olhar – como é que eu nunca fiquei sabendo dessa garota?
— Já disse que mainha está exagerando.
— Não acredito – Roberta além de linda era muito ciumenta. Aquele jeito dela me deixava arretado que só – Eu me lembro que você me contou tudo sobre Noronha. Sobre os seus amigos; sobre uma tal de Emília que você namorou. Sobre as praias do arquipélago, mas nada sobre uma amiga apaixonada chamada Charlote.
Eu me calei. Sabia que não poderia fugir da verdade, ela me alcançaria onde eu estivesse, então abri o jogo.
— Charlote era minha melhor amiga – comecei – crescemos juntos por causa da amizade dos nossos pais.
— Era? – Ela me questionou
— Éramos – continuei – antes de ir embora, me declarei a ela e ela a mim. Prometi que voltaria para vê-la e para ficarmos juntos, mas aí conheci você e os planos mudaram – eu tive que parar porque meu coração batia tão forte que meu corpo inteiro tremeu. Tomei o último gole de café, respirei profundamente e continuei – naquela noite que eu fui na sua casa eu mandei uma mensagem para ela, me despedindo e acabando com qualquer esperança que existia em relação a nós dois. Com isso eu acabei com a nossa amizade também. Charlote não quer mais falar comigo, até que me bloqueou no Facebook.
Os olhos de Roberta se encheram de lágrimas. Que diacho, Allan, lá estava eu mais uma vez magoando alguém.
— Nessa mensagem – ela engoliu o choro – você falou sobre mim?
— Não!
Foi um silêncio perturbador. Eu não sabia se aquilo doía mais do que falar a verdade a ela.
— Se afastou dela sem contar os motivos – uma lágrima desceu – se aproximou de mim sem me falar a verdade. E eu toda boba achando que o seu coração estava livre e que eu poderia conquistá-lo.
— E você conquistou – me aproximei dela segurando forte em seus ombros – Oxê! Que eu gosto demais de você, Roberta.
— Mas não me ama – ela me interrompeu e o peso daquelas palavras quase esmagou o meu coração – Está estampado bem aí nos seus olhos, a tristeza que você sente por saber que ela não é mais nada sua.
Eu não sabia o que dizer. Eu não tinha o que dizer.
— Você estragou tudo quando não me contou sobre ela – enxugou as lágrimas, se afastou de mim. Foi até o sofá e apanhou sua bolsa – eu preciso de um tempo.
— Roberta – caminhei até ela – Não existe mais nada entre eu e ela.
— Existe o amor – falou – e eu não posso lutar contra isso.
— Você está terminando comigo?
— Não – ela me respondeu – só estou te pedindo um tempo para colocar as coisas no seu devido lugar. Preciso ter certeza que vai valer a pena ficar com você.
Ela caminhou até a porta.
— Durante esse tempo, não me procure – ela abriu a porta – na hora certa eu virei até você.
E partiu. Eu fiquei completamente com os pés grudados no chão. Sem reação alguma.
Cabra frouxa!
Não argumentei, não insisti. Me calei e perdi a chance de convencê-la.
2
Quero esquecer, mas o destino não deixa
— Allan, você fez o que eu te pedi? – Lá estava mainha me arretando horas depois – seu pai está avexado menino.
— Não tive tempo – falei, borocochô.
— Oxente! Que cara azeda é essa, menino?
— Nada mainha – tentei mentir – dormir mal. Foi isso.
Dona Francisca ficou me observando e eu sabia que ela não tinha acreditado em nada do que eu havia falado. Eu não queria falar do ocorrido, porque se contasse eu teria que contar também os motivos do desentendimento com Roberta.
— Eu não posso – disse de repente. As palavras escaparam dos meus lábios sem minha permissão – Não posso falar com Charlote, visse.
— Oxê! Por quê?
Pronto! A pergunta que eu não queria responder.
— A pois mainha – fiquei avexado, quis logo mudar de assunto ou, pelo menos, a direção dele – por que a senhora tinha que falar aquelas coisas para Roberta, ontem? Me arrumou uma encrenca sem tamanho, visse.
— Eu lhe arrumei? – Ela colocou a mão na cintura me avisando que eu estava deixando ela nervosa – Não mude de assunto não seu cabra e me responda porque você não pode falar com Charlote. O que diacho aconteceu?
Engoli uma bola enorme de saliva que saiu rasgando minha garganta. Que diacho, eu era um péssimo mentiroso, nem tentaria inventar uma história, pois eu sabia que falharia.
— Nós brigamos.
— Que diacho! – Falou sem surpresa – e o que seu pai tem a ver com isso?
— Eita!
Fiquei impressionado com a insensibilidade de mainha.
— Desculpe meu filho – ela foi sincera – arrume outro jeito então de falar com o seu Chico que não seja por meio de Charlote, mas dê o seu jeito.
— Darei.
Disse, com a esperança que ela encerrasse de vez aquele assunto mesmo eu não sabendo como daria o meu jeito.
— Seu pai comprou um celular – ela disse toda alegre – seu Chico bem que podia arrumar um também. Mas voltando para o assunto, por que mesmo você brigou com Charlote?
Eu não soube o que dizer. Eu não queria contar para ela que eu estava apaixonado pela minha melhor amiga.
— Besteira mainha – disse – sabe como Charlote é. Logo passa.
— Sei – me olhou desconfiada – a pois, e Roberta? Ficou de ciumeira foi?
— Oxente! Não tinha nada que a senhora dizer a ela que eu e Charlote vivíamos grudados como se fossemos mais que amigos, visse.
— Quem é que em Noronha não sabia que Charlote arreava os pneus por você?
— A senhora andava com fuxico da minha vida, mainha?
— Tu me respeitaste seu cabra – ela deu uma chapoletada na minha orelha – Dona Lúcia que sempre vinha falar comigo sobre o chamego de vocês dois, visse. Andava preocupada porque eram novos demais e que depois que fossemos embora Charlote sofreria.
— E ela sabia, era?
— Então é verdade?
Arregalei os olhos pra mainha assustado com minha própria confissão.
— Não me venha com outra mentira – ela foi falando antes mesmo de eu responder – fale logo e deixe de enrolação.
— É verdade – confessei – é verdade ainda que eu também arreava os pneus por ela.
Agora sim mainha fez cara de surpresa, espanto.
— Por isso nós brigamos. Eu disse a ela que não voltarei mais a Noronha e pedir que ela me esquecesse – um nó sufocou minha garganta. Eu queria mesmo era chorar – Por isso também a Roberta pediu um tempo. Eu não contei a ela sobre Charlote. Eu mentir.
— Que diacho! – Falou com tristeza – Que bronca você se meteu, visse.
— Promete que não contará para, painho?
— Oxê! Está me chamando de fuxiqueira seu cabra?
— Não, mainha.
Tentei acalmar a situação.
— Não sei porque escondeu isso da gente, visse. Eu gosto da ideia de você e Charlote de chamego por aí. Seu pai também não se importaria.
— Esqueça, mainha – eu disse com o coração pulando de alegria por saber daquilo, mas triste pela minha realidade – não voltarei para Noronha. Meus planos é ficar com a Roberta.
— Que pena! – Ela disse – Espero que você consiga mandar no seu coração e um dia esquecer Charlote.
Me calei. Eu não sabia que queria esquecer Charlote. Se poderia, mas era necessário seguir em frente e deixá-la fazer o mesmo.
— Você sabe que voltaremos para Noronha um dia – mainha falou – que isso aqui é só uma fase e que nossa vida está lá. Assim que seu pai se aposentar voltaremos para nossa casa.
— Eu sei – sussurrei – mas estou pensando seriamente em ficar. Gosto de São Paulo.
— Ah, Allan, meu filho – acariciou o meu rosto – você já é um homem-feito, faz suas próprias escolhas, mas saiba que a vida é uma caixinha de surpresas e estamos sempre a mercê de mudar o rumo de nossas vidas sempre que possível.
Foi nessa hora que o painho entrou em casa. Observou a gente, desconfiado, como se tivesse ouvido a conversa por trás da porta.
— Alan, meu filho – colocou a mochila sobre o sofá – já entrou em contato com Charlote?
Imediatamente olhei pra mainha. Foi um pedido de socorro.
— Meu velho – mainha disse – Hoje mesmo ele fará isso, não é mesmo Alan?
Balancei a cabeça afirmando e dei um jeito de amarrar o meu jegue. Mainha não só me livrou de dar explicações a painho, como também me deu um aviso de que eu precisava arrumar o meu jeito e resolver aquilo de vez. Como? E eu sei lá.