Capítulo 144
2330palavras
2023-02-07 09:49
- Mama? – Maria me estendeu os braços.
Senti meu coração partir em mil pedaços e fui na direção dela, sendo puxado para dentro da casa. A porta fechou e Daniel passou a chave.
- O que você faz aqui? – Ele perguntou.

Maria Lua seguiu com os braços na minha direção e Daniel me impediu de chegar perto dela. Foi o suficiente para ela começar a chorar veementemente.
Celine veio na minha direção e me entregou a menina:
- Detesto este choro dela. É uma mimada e manhosa.
Fechei meus olhos, sentindo o cheiro dos cabelos dela entrando pelas minhas narinas. Ela estava com a pele quentinha, o sangue circulando no corpo, as bochechas rosadas.
Deitou a cabeça no meu ombro e parou de chorar imediatamente.
- Mamãe está aqui, meu amor.

- Papai? – Ela olhou nos meus olhos.
- Papai também! – afirmei, vendo um sorriso no rosto dela, daqueles que fazia eu perder o juízo e doar um rim sem pensar duas vezes.
Limpei as lágrimas que ainda estavam no rostinho dela e perguntei:
- Está com fome?

Ela fez sinal afirmativo com a cabeça.
- O que você faz aqui, porra? – Daniel foi imediatamente até um balcão e pegou um revólver, colocando balas dentro.
- Daniel, eu só quero pegar a minha filha e sair daqui, por favor. – Falei.
- Acha que não sei que estão atrás de mim? – Ele me olhou com ódio.
- Como você consegue ser tão burra? – Celine perguntou.
Olhei mais atentamente para ela. Os cabelos estavam soltos. Usava uma calça jeans e uma camisa branca amassada. Os pés estavam com um tênis. Eu nunca a vi vestida daquele jeito.
- O que... Você está fazendo aqui? – Perguntei, confusa.
- Nada que lhe interesse. – Daniel respondeu por ela.
- Porra, o que está acontecendo aqui? – Fiquei tentando entender.
- Onde está Heitor? Trouxeram a Polícia? – Daniel estava ofegante, andando de um lado para o outro, a arma em punho.
Apertei Maria Lua contra mim e disse baixinho:
- Fica bem quietinha, ok? Tudo vai dar certo... A mamãe promete.
- E o papai? – Ela levantou as mãozinhas, querendo se fazer entender.
- Papai está aqui. – Ouvi do lado de fora da porta. – Abre, Daniel, estou sozinho. E desarmado.
Daniel me olhou e riu, debochadamente:
- Vocês só podem estar loucos!
- Não, só queremos a nossa filha.
- Se quisessem a menina realmente não estavam se fazendo de bobos e tentando economizar de me passar a grana.
- Abre para Heitor, por favor. – Pedi. – Vamos conversar e tudo ficará bem.
- Não, não ficará tudo bem. – Celine disse. – Eu avisei, porra. – ela olhou para Daniel – Mas você nunca me ouve.
- Vocês... – Olhei para os dois, sem saber a relação que os unia de alguma forma.
Heitor começou a bater com força na porta. Daniel pegou-me pelo pescoço, sem fazer muita força e virou-me em direção à porta, apontando a arma para minha cabeça.
- Abre a porra da porta. – Ele ordenou para Celine, que retirou Malu do meu colo, fazendo-a chorar novamente.
- Mamãe... – Ela estendia os braços na minha direção.
Celine abriu a porta e Heitor ficou imóvel, olhando nos meus olhos. Sem falar nada, ele levantou os braços, devagar e deu um passo para dentro da casa. Celine olhou pela varanda, para os dois lados e fechou a porta.
- Chamou a Polícia? – Ela perguntou para Heitor.
- Que porra você está fazendo, Celine? Você está por trás do sequestro da minha filha? – Heitor ficou confuso.
- Não é sua filha... É uma bastarda e você sabe disto.
- Não repita isso novamente, ou não vou ter piedade de você, Celine.
- Não quero sua piedade, Heitor.
- Qual a relação de vocês? – Ele olhou para ambos, tão surpreso quanto eu.
- Papai... – Maria tentou se jogar nos braços dele, o choro começando a ficar insistente.
- Ela está com sono. – Ele disse. – Deixe-me pegá-la e a faço dormir...
Ela balançou a cabeça, aturdida. Eu sabia que o choro de Malu incomodava, principalmente quando ela estava sonolenta. Esperava que aquilo acabasse com a sanidade de Celine.
- Não... – Ela se afastou, com Malu no colo.
- Daniel, largue a minha mulher.
- Heitor, por que você é tão idiota? Eu só queria a grana!
- E depois, Daniel? Quando acabasse você quereria mais e mais. Isso é uma bola de neve e ambos sabemos disso. Eu e Bárbara viemos aqui para sentarmos e discutirmos o que podemos fazer.
- Qual sua relação com Salma, afinal? – perguntei, sentindo a arma na minha cabeça.
Eu poderia dizer que estava com medo. Na verdade, eu tinha mesmo que estar morta de medo. Mas acho que o meu maior medo era acontecer algo com a minha filha, que estava nas mãos de uma Celine completamente diferente da que eu conheci. Sinceramente, se eu levasse o tiro morreria e pronto. Mas ver algo acontecer com a minha filha seria o fim da minha vida, da mesma forma.
- A relação que você sempre viu, porra. – Ele disse, gritando.
Toquei a arma e abaixei lentamente, as mãos trêmulas, sem ele contestar. Virei na direção dele, com calma e o encarei, no fundo dos olhos azuis:
- Por que isso tudo? Porra, quando conheci você era um homem trabalhador... Caralho, você tinha dois empregos, dava um duro danado para do nada decidir ficar rico às custas de Heitor? Nunca me passou pela cabeça que você pudesse ser este ser desprezível. Eu cheguei a gostar de você...
Ele riu, ironicamente:
- Não, você nunca gostou de mim.
- Eu sabia que tinha algo errado com você, desde o início. Mas eu gostava, sim. Isso não significa que tinha segundas intenções com isso.
- Eu nunca fui o homem que você conheceu, Babi.
- Como assim?
- Tudo planejado, desde o início.
- O que? Me conte... Você não tem nada a perder. Eu preciso saber a verdade. São nossas vidas que estão em jogo neste momento... A minha, a sua... A da minha filha. Você estava junto quando a peguei nos braços, sabe o quanto senti a morte da minha amiga... Por que agiu assim?
Ele olhou para Celine, que respondeu:
- Eu e Dani planejamos isso tudo.
Dani? Ouvi certo?
- Não... Não planejamos juntos. Você planejou, Celine. Por mim, ficávamos juntos e você sabe disso. Eu só queria você.
- Caralho... Vocês têm um caso? – Heitor perguntou.
- Não é um mero caso... Faz anos que estamos juntos... Muitos anos. – Ele respondeu.
- Você foi a mentora disso tudo, sograsta? – Perguntei, aturdida.
- Me dê a menina, Celine. – Heitor pediu novamente.
- Que porra, entregue a menina! – Daniel gritou. – Não aguento o choro dela.
Celine entregou Malu a Heitor. Senti meu coração se aquietar por hora.
Ouvimos um estouro na porta dos fundos e da frente, ao mesmo tempo. Daniel não teve tempo de empunhar a arma. Ficou tão nervoso que ela caiu no chão. Antes que ele conseguisse pegar, Anon 1 a resgatou.
- Celine? – Allan olhou para a ex mulher dentro da casa.
- O que você faz aqui? – Ela perguntou, surpresa.
As armas de todos estavam apontadas na direção de Celine e Daniel. Corri até Heitor e Maria Lua e os abracei, temendo que algo ainda pudesse acontecer ali. Não queria que minha filha presenciasse a morte de ninguém.
- Você estava por trás disso? Queria fazer mal à minha neta? Receber dinheiro em troca de uma criança inocente?
- Ela não é sua neta, seu idiota. Por que finge que tudo está bem? Me mandou embora porque esta mulher – ela apontou na minha direção – E filha de um fantasma do seu passado. Deixou tudo... Por uma besteira, um capricho, um passado que estava enterrado.
- Beatrice nunca esteve enterrada para mim, Celine. E eu sempre soube que você tinha alguém... Mas não pensei que fosse de tanto tempo... Ou que pudessem planejar tamanhas atrocidades juntos.
- Quero meus direitos. – Celine disse altivamente. – Inclusive o de ficar calada.
Anon 2 foi até ela, enquanto retirava a própria gravata do pescoço. Colocou as mãos de Celine para trás e amarrou-as com o tecido, dizendo:
- Tem o direito de ficar calada, senhora... Mas como não somos da Polícia, poucos nos importamos com os direitos.
- Vocês... Vão me levar presa, não é mesmo? – Ela olhou para todos, confusa. – Em consideração aos nossos anos juntos, Allan. Não pode fazer nenhuma maldade comigo. E Milena? – ela olhou para Sebastian – Você não vai conseguir dormir com a minha filha sabendo que fez mal à mãe dela.
- Eu consigo. – Sebastian garantiu. – Assim com você dormiu todas as noites, mesmo sabendo que minha mãe havia perdido o bebê por sua culpa. Fez todas as maldades possíveis com sua própria filha... Sim, eu vou deitar a cabeça no travesseiro e finalmente dormir, sem sonhar como seria ver o seu fim... Porque ele chegou.
Ela riu, maldosamente:
- Tem muita gente aqui... Testemunhas demais para vocês me fazerem algum mal.
- Quer fazer as honras, Sebastian? – Allan perguntou-lhe.
- Gostaria, Allan. Mas se quiser, posso lhe dar a preferência, já que é idoso.
- Eu gostaria, garoto... Juro que gostaria. Mas sei que você precisa fazer isso mais do que eu.
Gente, em que mundo eu estava? Meu irmão era capaz de matar alguém? Acho que sim, afinal, Allan estava numa cadeira de rodas em função de um Perrone... Neste caso, nosso pai.
- Otávio, poderia vir comigo e trazê-la? – Sebastian pediu.
- Claro, senhor.
- Todos para rua. – Allan ordenou.
Aquela frase foi suficiente para em segundos os homens armados sumirem da nossa vista, ficando só Anon com a arma apontada para Daniel.
- Isso é surreal... – Me ouvi dizendo. – Não quero que Malu ouça isso tudo.
- Ela dormiu. – Heitor virou, me mostrando a cabeça dela descansando no ombro dele, a boquinha babando.
- Ela disse que estava com fome. – Falei, sentindo meu coração apertado.
- Vamos resolver isso de uma vez, pai. – Heitor falou – Quero ir para casa com minha mulher e minha filha.
- O que vocês vão fazer com Celine? – Daniel perguntou, nervoso.
- Por que você pediu a Babilônia? – Perguntei.
- Não sei... Não houve um motivo em especial. – Ele confessou.
- Achou mesmo que ganharia o dinheiro de Heitor?
- Quer saber, Babi... Eu fiz tudo isso porque Celine me convenceu. Eu gostava dela.
- Nosso encontro a primeira vez... Na Babilônia...
- Até então você não tinha nada a ver com a história. Eu fui trabalhar lá a mando dela, para estar a par de tudo que Heitor fazia. A principio ela via Cindy como uma ameaça. Mas daí você apareceu e virou tudo de cabeça para baixo. E ela percebeu que era muito mais sério do que parecia.
- Herança, dinheiro... Era só isso que ela pensava. Por isso a deixei fora do testamento e casei sem comunhão de bens. Jamais dividiria o império que criei sozinho com uma mulher como ela – Allan disse – Mas meu rapaz, bem sabemos que você fez um pequeno estrago na vida do meu filho e minha nora.
- Estrago? Este desgraçado tentou estrangular a minha mulher. Não há perdão para ele. – Heitor disse.
- Então mande mate-o de verdade desta vez, meu filho. – Allan disse, virando a cadeira de rodas e seguindo vagarosamente para a porta.
Olhei para Daniel. Eu poderia ter um pingo de piedade. Mas lembrei dos olhos dele ao tentar me matar, suas mãos sobre o meu pescoço, apertando a garganta com força. Ele e Celine foram capazes de sequestrar uma criança de um ano e pedir dinheiro sem ao menos saberem o que queriam e como queriam. Era como se tudo que fizessem sempre tivesse o intuito da violência e vingança.
- Deus... Ela tentou matar a minha filha afogada na piscina... Você tentou me estrangular. Isso nunca vai acabar, não é mesmo? Eu já sabia que era um ciclo vicioso. – Falei.
- Anon, ou você faz bem feito desta vez ou vou tomar atitudes mais severas com relação a você – Heitor falou.
- Quer alguma prova, senhor?
- Não... Mas se ele aparecer de novo na minha vida ou eu sequer imaginar que ele ficou vivo, você não conseguirá emprego nem no Polo Norte.
- Ficou bem claro, senhor.
Anon amarrou os braços dele com um cordão que parecia comprado para aquele fim, que retirou do bolso e saiu com Daniel.
- Ei, você não pode me matar, Heitor. Eu vou acusa-lo de tentativa de homicídio e...
- Como vai fazer isso, criatura? – perguntei – Você já vai estar morto.
Ele virou o rosto da minha direção e disse:
- Nos vemos no inferno, Bárbara!
- Com certeza... Vou acabar com você lá também, desclassificado. Porque aqui não serei eu a acabar com a sua raça. E quer saber, estou até pensando na roupa que vou usar para ver você queimar no fogo do inferno? Quero saber a videira sob a qual você será enterrado, pois vou fazer vinho do seu sangue. Você mexeu com a minha filha, Daniel... Isso foi sua sentença de morte.
- Espero que não durma durante a as noites, com a consciência pesada... – a voz dele foi ficando cada vez mais longe, enquanto Anon o retirava dali.
- Me entregue ela, por favor. – Pedi.
Heitor colocou Maria Lua no meu colo. Dei um beijo no rosto dela e falei:
- Mamãe vai planejar o rótulo do vinho que vou fazer com ele. Creio que até já me passa pela cabeça como vou chamar... cattivo sangue.