Capítulo 115
2725palavras
2023-02-07 09:33
Abri os olhos, ainda um pouco zonza. Estava tensa e levantei imediatamente, lembrando exatamente de tudo que havia acontecido.
Eu estava no quarto de Heitor.
- Acalme-se, Bárbara. Não pode levantar assim. – Heitor veio até mim, deitando-me novamente na cama.
- Desclassificado, se você tem uma algema à mão, me prenda agora. Ou eu vou fugir. – Implorei, enquanto ele sorria com o canto dos lábios, lindamente.
Ele segurou meus ombros e encarou-me:
- Não vai fugir, Bárbara. Eu não vou deixar. Você está presa a mim, para sempre.
- Preciso levantar. Onde está Maria Lua?
- O bebê? Está com Nic. – Ele disse.
Retirei as mãos dele dos meus ombros e levantei, colocando as sandálias.
- Bárbara, o que você tem?
- Medo... – Confessei.
- Me desculpe. Não queria assustá-la. Juro que pensei em fazer o pedido só nós dois. Mas quando falei ao meu pai, ele fez questão de estar presente. Então... Acabei cedendo ao desejo dele. Mas só porque ele tem pouco tempo de vida. Caso contrário, eu pouco me importaria com isso tudo. Porque eu só quero você, Bárbara.
- Quem é o homem estranho lá embaixo?
- Ele é meu assessor na Babilônia. E a namorada dele, que é uma das dançarinas de pole dance.
- Amiga da loira do pau do meio? – Encarei-o.
- Eu não sei responder sua pergunta, Bárbara. Não há como saber se as duas são amigas. Não tenho informações sobre a vida pessoal dos meus funcionários. E nem quero misturar as coisas.
- Jura? – Ironizei.
- Caralho, você está louca? Eu não os convidei. Ele veio resolver umas questões de trabalho importantes, que não poderiam esperar para amanhã, visto que fiquei fora alguns dias. Então insisti que ficassem para o jantar. Mas posso mandá-los embora, se preferir. Mas se vai me recusar, diga de uma vez, Bárbara. Tem ideia de quanto tempo me peguei olhando vídeos e imaginando como faria o pedido? E no fim... Fiz tudo errado.
- Eu amo você, Heitor – o abracei com força – E senti tanta saudade e contei os minutos para encontrá-lo depois desta viagem que pareceu não ter fim. Mas não posso lhe dar a resposta antes de lhe contar uma coisa.
Ele afastou-me e arqueou a sobrancelha, curioso:
- O que quer me dizer?
Ouvi o choro de Maria Lua dali e abri a porta imediatamente, descendo as escadas correndo, pegando-a do colo de Nicolete, que a balançava deitada, tentando acalmá-la.
- Estou aqui, meu amor! – Aconcheguei-a ao meu peito, acalmando-a imediatamente.
- Ela deve ter estranhado... – Nicolete sorriu para mim, parecendo saber a verdade de alguma forma – Ela é linda.
- Sim... A coisa mais linda do mundo.
Olhei para Heitor, os cabelos já estavam desalinhados e os olhos dele pareciam confusos. Fui até Allan e lhe dei um beijo no rosto:
- Que bom que está aqui, Allan. Fico feliz que esteja bem.
- Eu também, minha querida.
- Boa noite, Celine. – Cumprimentei.
Ela não respondeu, simplesmente acenando com a cabeça, os olhos queimando de ódio que não conseguia disfarçar. Mentir seria fácil, afinal, ela mesma achava que Maria Lua era minha filha.
Olhei para o casal que até então eu não conhecia:
- Muito prazer. Sou Bárbara Novaes, namorada de Heitor... E a razão de ele ter sido preso ao dirigir uma moto sem habilitação... E estar tentando ser um homem diferente – sorri, olhando para ele, que parecia ficar cada vez mais confuso – E esta aqui... É Maria Lua. E... Eu cuido dela. Mas não sou a babá. Ela é nossa, Heitor. É... Sua.
Meus olhos encontraram os dele e inesperadamente, ele não esboçou nenhuma reação. Permaneceu de pé, imóvel, sério.
Eu amava aquele homem mais do que tudo na vida. Olhei para Maria Lua, já quase adormecida novamente, os olhinhos quase fechando. Ela também era tudo para mim e perdê-la significava a pior dor que eu poderia sentir na vida. Os dois eram tudo que eu tinha.
Eu amava Heitor. E ela era parte dele. E os dois eram parte de mim.
- Que porra você está tentando dizer? – Ele finalmente conseguiu esboçar alguma reação.
Não, eu não podia mentir. O amava demais para enrolar uma história que já tinha praticamente acabado com nosso relacionamento. Ele foi sincero. Ele estava me pedindo em casamento. Eu não podia chegar ali, na casa dele, em frente à sua família, e dizer uma mentira. Não era justo com o homem que queria dividir a vida inteira comigo.
- Que ela é sua filha. – Afirmei, em alto e bom som, com meu corpo todo tremendo.
- Isso é algum tipo de brincadeira, Bárbara? – Ele seguiu no mesmo lugar, sem dar um passo sequer.
Neguei com a cabeça. Tenho certeza de que foram os segundos que mais demoraram a passar na minha vida.
- Quero que vão embora agora, por favor. – Ele olhou para o homem e a mulher, que calados levantaram e se dirigiram à porta, que Nicolete abriu para eles.
Respirei fundo, apertando a pequena contra mim, como se ela pudesse me proteger mais do que eu a ela naquele momento.
- Ok, diga agora que tudo é uma brincadeira. Que está me testando – ele pediu – Eu sei que é isso.
- Bárbara “Novaes”? – Allan disse, não olhando na minha direção, parecendo simplesmente estar pensando em voz alta.
- Bárbara Novaes, filha de Beatriz Novaes, neta de Mandy Novaes... – Falei.
Chegava de mentiras. Se eu queria fazer parte daquela família, tinha que ser sincera.
- Não pode ser... Como eu não percebi antes? – Ele me encarou, os verdes profundos dos seus olhos dentro dos meus.
- Eu soube há pouco tempo também. Mandy me contou por causa... Da menina. – Olhei para Maria Lua, inocentemente dormindo, enquanto eu me resolvia com sua família.
- Do que vocês dois estão falando? – Celine levantou, curiosa e preocupada.
- Deus! Como o destino a colocou no meu caminho? – Ele balançou a cabeça, aturdido.
- Allan, me conte o que está acontecendo? – Celine exigiu.
- Me diga que foi coincidência... Que não me procurou de propósito. – Allan me encarou novamente, ignorando a esposa.
- Não... Eu juro. Se tem uma coisa que não sou é mentirosa, Allan. Eu quase fui... Agora pouco. Mas vou enfrentar as consequências da verdade, mesmo que eu ponha tudo a perder. – Olhei para Heitor.
- Me diga agora, Allan. – Celine quase gritou.
Nicolete parou na minha frente e disse, abrindo os braços:
- Me dê a criança. Resolva tudo e eu cuido dela.
- Ela... Vai chorar. – Aleguei, amedrontada.
- Eu prometo que não. Me mostre onde está a mamadeira... Resolva o que precisa e quando acabar, estarei aqui, com ela, eu juro. Ela não precisa ouvir tudo isso... O soninho dela é leve.
- Sim... – Eu sorri, tentando me acalmar, enquanto entregava-a no colo de Nicolete, praticamente implorando com meus olhos que ela me devolvesse depois.
- Vou devolver... Eu juro. – Ela pareceu ler meus pensamentos.
Acompanhei com meus olhos Nicolete desaparecer com a minha filha nos braços, carregando a bolsa de bebê no ombro. Talvez fosse realmente o melhor a fazer naquele momento.
Encarei Heitor, que já havia retirado a gravata, com os cabelos completamente bagunçados, de tantas vezes que passou os dedos por eles, de forma nervosa.
- De onde vocês se conhecem? – Celine continuou.
- Bárbara é filha... De Beatriz... A primeira mulher que me apaixonei.
- O que mais você esconde? – Heitor perguntou entredentes – Ou melhor, qual mentira vai continuar contando agora? Não acredite nela, pai. É uma mentirosa.
- Eu não estou mentindo, Heitor. Juro.
- Mentirosa... Desclassificada... E eu posso repetir o significado total desta palavra para você.
- Por favor... Não... Ela não é minha filha... Não é nossa... Mas é sua.
Ele riu, nervosamente, e depois cruzou os braços:
- Vamos, conte sua mentira. Quero ver tudo que você é capaz de fazer para me enganar.
- Não é mentira!
Eu podia chorar. Eu queria chorar... Mas não faria isso. Precisava ser forte naquele momento... Por mim e por Maria Lua. Eu sabia que não seria fácil aquele momento. Mas também não imaginava o quanto ouvir repetidas vezes a palavra “mentirosa” da boca dele me doeria tanto.
Heitor veio até mim e pegou meu braço, de forma brusca e agressiva:
- Venha, vamos conversar nós dois.
- Solte-a agora! – Allan gritou, firme, sério, assustando todos nós.
Imediatamente Heitor soltou meu braço, que doeu pela forma como ele segurou, tamanha força que colocou nos dedos. Olhei a minha pele avermelhada, remetendo-me a um passado do qual tanto tentei esquecer.
Passei a mão no braço, levemente, vendo a marca dos dedos dele começarem a aparecer, clareando a região, como se o sangue tivesse sumido daquela parte.
- Não foi assim que eu o ensinei a tratar uma mulher. – Allan veio na minha direção, dirigindo sua cadeira de rodas com habilidade.
- Não mesmo... Me ensinou a traí-las, engravidá-las, renegar a paternidade. A acabar com as pessoas que lhe ajudaram, fazendo filhos bastardos em suas esposas.
- Você não sabe do que está falando. – Ele disse, entredentes, furioso.
- Então nos diga, por favor... A verdade – pedi – Não importa que Heitor tenha me machucado... Isso não foi nada perante tudo que já passei na vida. Quantas vezes acha que fui agredida, de forma pior? A diferença é que eu não fazia nada para merecer ser tratada daquela forma.
- E agora fez? – Heitor me encarou – Admite sua mentira?
- Não. Eu não estou mentindo. – Afirmei, tentando não gritar.
Ele se aproximou e pegou meu braço, olhando-o. Depois largou, passando a mão nervosamente no rosto, os olhos avermelhados, enquanto balançava a cabeça:
- Eu machuquei você, porra! – gritou – Olha o que eu fiz... O que você me obrigou a fazer.
- Está tudo bem.
- Não está, porra! Não está! Eu nunca fiz isso... Nunca... – Ele pegou uma escultura que parecia um vidro enrolado, transparente, em torno do corpo de uma mulher e jogou-a na parede, quebrando em mil pedaços, fazendo com que eu desse um salto para trás, agora realmente assustada.
- Por Deus, Heitor, acalme-se – Celine pediu – Mande esta mentirosa embora com a criança e tudo está resolvido. Impeça a entrada dela na casa... Faça com que Bárbara se mude de país para pagar pela forma como tentou enganá-lo. Eu nunca acreditei em você, menina. Nunca.
- Sebastian... Ele é... – Allan me olhou, pegando minha mão.
Senti uma lágrima incontida, no meio de toda minha força que começava a desabar naquele momento. Limpei, olhando para ele:
- Sim. Sebastian é meu irmão. – Confessei.
Heitor ficou parado, depois de mover-se incontrolavelmente por todos os lados. Não me atrevi a olhar nos olhos dele. Abaixei a cabeça, não porque me envergonhava de ser irmã de Sebastian Perrone, mas porque não queria que Heitor visse que eu estava chorando.
- Você é... Bárbara Novaes Perrone? – Allan questionou-me, de forma tranquila, parecendo querer entender.
- Não... Eu não quis o sobrenome dele... Por tudo que fez para minha mãe.
- Eu só traí uma mulher na minha vida: Beatriz Novaes. Seria motivo para lamentar-me para sempre, pelo amor que senti por ela. Trair alguém indo para cama por prazer com outra pessoa não dói... Agora, ver o sofrimento nos olhos de quem você mais ama por ter destruído seu coração e sua confiança é algo que não sai nunca da sua cabeça. Ainda assim, tentei não me arrepender, pois disso nasceu Heitor, o meu filho. – Ele olhou na direção de Heitor.
- Você... Se envolveu com a mãe de Bárbara? – Heitor ficou confuso – É isso mesmo?
- Conheci Beatriz quando éramos muito jovens. Ela era de família rica e o pai não deixou que ficássemos juntos – ele olhou para mim – Sua mãe deixou tudo por mim, Babi...Tudo. E em troca, eu a traí, ficando com a mãe de Heitor.
- Eu sei. Mandy me contou parte da história. Mas eu ainda tenho dúvidas... Muitas. Minha mãe jamais mencionou nada. Cresci sem saber quem era meu pai. A única coisa que ela fazia questão de dizer é que poderia suprir todo o amor paterno. E que seríamos sempre nós duas... Só nós duas. E ela conseguiu... – falar de minha mãe era algo que me levava para um patamar de sentimentos inexplicáveis e saudosos. As lágrimas ficaram mais fortes e não tentei mais impedi-las. – Ela foi uma mãe perfeita... E me criou sozinha. Jamais voltou para a casa dos pais... Abriu mão de tudo, mesmo quando você se foi e deixou.
- Eu voltei e tentei ficar com ela novamente – Allan ficou olhando para o nada, a visão parada, como se estivesse no passado naquele exato momento – Ela aceitou. Fui feliz por mais um tempo, enquanto a tive em meus braços... Um infeliz, um traidor, um canalha, com duas mulheres... Mas deixar Beatriz era impossível – ele suspirou – Ela não me queria. Só quis dar o troco, pagar na mesma moeda. Sua mãe jamais me perdoou... E eu me culpei eternamente.
- E ela fez isso... Com Francesco Perrone?
Ele assentiu com a cabeça, agora me encarando:
- O desgraçado a engravidou e deu um anel para que ela abortasse...
- O anel... Do cemitério. – Heitor me olhou.
- Sim... O que você pegou na caixa de lembranças da minha mãe e depois me devolveu. Eu só soube... Porque Sebastian me contou.
- Então... Você se envolveu com Soraia Perrone... De propósito? – Celine perguntou.
- Sim. – Ele confessou.
- Vingança? – Perguntei.
- Era o mínimo que eu podia fazer por Beatriz... Francesco tinha que pagar pelo que fez a ela.
- Porra, porra, mil vezes porra! – Heitor socou o ar, furioso, confuso, perplexo.
- Teve alguém inocente nesta história toda? – Perguntei.
- A minha esposa, mãe de Heitor. Ela foi a única inocente, que não soube de nada... Eu não a amava, mas larguei tudo pelo filho que ela esperava. Abri mão do amor da minha vida... Para ser pai. Mas não consegui sentir nenhum tipo de afeto pela criança que Soraia Perrone gerou. Porque eu só quis atingir Francesco e assim fazê-lo sofrer, de alguma forma, pelo que ele fez com Beatriz. Soraia só era uma mulher fácil... Qualquer um poderia ter transado com ela.
- E depois que você soube que ela me esperava? O que aconteceu?
- Beatriz sumiu. Nunca mais a encontrei.
- Não pensou... Em colocar um detetive atrás dela, como Sebastian fez para me encontrar?
- Não... Se ela não queria ser encontrada, eu não a procuraria. Foi de mim que ela fugiu, do sentimento forte que nos unia. Eu tinha um filho... Ela seria mãe em breve. Não podíamos continuar com aquilo.
Celine sentou no sofá, o corpo parecendo cair.
- A North B... O nome foi em homenagem a ela.
- B... De Beatriz? – Heitor questionou – Eu... Sempre imaginei que fosse de Beer...
- Nunca me perguntou. Se perguntasse, eu teria dito a verdade.
Heitor veio até mim e limpou minhas lágrimas com os polegares, passando os dois ao mesmo tempo no meu rosto.
Depois pegou minha mão e levou-me até uma porta, onde abriu com a digital e entramos numa sala gigantesca, com uma mesa cheia de papéis, como se fosse de reunião de trabalho. Em volta dela, várias cadeiras e as paredes rodeadas de estantes, com livros.
- Me perdoa por tê-la machucado... Por favor.
- Sim... Não se preocupe.
- Vou lhe dar uma última chance de dizer a verdade e tentar se redimir. Diga que dormiu com outro ou “outros” homens e esta criança é sua e que está tentando me enganar, querendo que eu assuma a paternidade. E desta forma eu não vou acabar com você.
- Não vou dizer isso. Você é o pai... Embora eu não seja a mãe.
Ele gargalhou e olhou firmemente nos meus olhos:
- Eu não posso ser pai. Eu tenho vasectomia, sua mentirosa. Quero você fora da minha casa, da minha vida e longe dos Casanova. Agora!