Capítulo 75
1999palavras
2023-02-06 11:24
- O que houve?
- Nada sério, mas preciso que venha.
- Não me preocupa, porra.

- Estou bem, juro. Só preciso de você.
- Em quinze minutos chego.
- Ok.
Estava saindo na porta quando lembrei do casaco, pegando qualquer um que estava na frente e jogando sobre meus ombros.
Eu precisava resolver de uma vez por todas a situação entre Sebastian e Milena. Me doía ver os dois sofrendo sendo que se amavam e tinham sido afastados por suas famílias egoístas e mesquinhas.
Se não se acertassem, tudo bem. Mas pelo menos se veriam e decidiriam se perdoar ou colocar um fim a tudo aquilo e seguirem suas vidas.

Sentei de volta no sofá, já desistindo da minha comida que estava na mesa e certamente tinha esfriado.
- Qual sua relação com Cindy? – perguntei. – Para ela ir lhe falar essas mentiras?
- Não somos amigas... Também não inimigas.
- Mas você sabia que ela tinha um caso com Heitor?

- Sim, eu sabia. – Ela abaixou a cabeça.
- E aceitava?
- Julgamentos? – Ben ironizou.
- Não, não estou julgando. Só tentando entender. – Justifiquei.
- Que diferença fazia com quem ele dormia? – ela deu de ombros. – Para mim era só alguém que eu gostava como um familiar... Um amigo. Não havia ciúme... Nunca houve. Foi um noivado forçado.
- Pela sua mãe, não é mesmo?
- Sim.
- Por que... Aceitou?
- Eu não sei. Nunca fui muito de contestar. Sempre achei que minha mãe queria o meu bem. Não que hoje eu pense diferente, mas me arrependi de algumas coisas que deixei no passado. Hoje sou mais madura. Os erros nos fazem aprender.
- Concordo. – Salma disse, ainda à mesa.
Sim, era uma conversa entre nós duas, mas meus amigos e eu estávamos acostumados a nos ampararmos e falar o que pensávamos. Então eles não se importavam de dizer o que achavam daquilo tudo para a ex-noiva de Heitor. Além do mais, éramos experts em fazer porras e agirmos errado. E também em corações partidos.
- Sebastian é um homem lindo e de boa índole. – Salma disse. – Sinceramente, eu não sei o que você está esperando. E se ele conhecer outra pessoa e se apaixonar? – indagou.
Ela abaixou a cabeça, não respondendo, parecendo confusa.
- Já fiz um monte de burradas no passado em função de ceder às vontades de outra pessoa, colocando outrem à frente de mim mesma. E vou lhe dizer: isso é horrível. Eu superei, com a morte desta pessoa. Mas sua mãe está bem de saúde. E se ela demorar para morrer e você perder toda a sua vida por conta dela? – Questionei.
- Minha mãe é depressiva.
- Você também. – Observei.
- E quem não é hoje em dia, baby? – Ben falou, levando seu prato até a pia. – Vida corrida, falta de tempo, falta de dinheiro, falta de amor... Quem resiste? Se vocês duas são depressivas, estão no empate. Ou seja, viva a sua vida, querida. Sua mãe deixou de viver a dela por você ser depressiva?
Novamente não houve resposta. Torci para Sebastian tirá-la daquela teia de manipulação na qual aquela mulher vivia. A relação dela com a mãe não era diferente da minha com Jardel. Se eu consegui sobreviver e superar, ela também conseguiria.
A campainha tocou. Senti meu coração batendo mais forte. Saber que os dois se reencontrariam ali me deixou nervosa.
- Estamos esperando mais alguém? – Salma ainda comia.
- Não que eu saiba. – Menti.
Fui até a porta e abri, dando de cara com Tony parado.
Ele era alto e o vi observando Ben sobre a minha cabeça. Porra, seria uma noite tensa.
- Quer entrar e aproveitar a terapia? – ironizei. – É de graça.
- Precisamos conversar. – Ele olhou para Ben.
Dei um passo para o lado a fim de que ele entrasse e então Sebastian apareceu, com seus mais de 1,80 metros e os olhos azuis mais calorosos do mundo. Meu irmão... Que orgulho! Me vi sorrindo enquanto o observava. A única coisa ruim naquilo tudo é que tínhamos sangue Perrone nas veias. De resto, era perfeito.
Milena levantou, confusa e surpresa e Tony entrou, junto de Sebastian.
- Chegou o seu casaco, Babi? – Salma perguntou debochadamente. – Eu... Vou tomar um banho. E dormir. Fiquem à vontade e por favor: sem gritos. Vou levar junto as facas.
- Deixe as colheres, por favor. – Ben disse imediatamente. – Posso precisar... De muitas. – Sorriu nervosamente.
Sebastian e Milena seguiam se olhando, sem dizer absolutamente nada.
- Sebastian, esta é Milena. Milena este é... É... – Fiquei incerta de dizer ou não para ela a verdade.
Sebastian estendeu a mão a ela, dizendo:
- Sebastian Perrone, irmão de Bárbara Novaes.
Ela ficou sem palavras. Eu? Ah, meu coração ficou tão diferente. Me senti acolhida, de alguma forma. Eu tinha orgulho dele, mas vergonha de dizer ao mundo que éramos irmãos e eu uma Perrone.
- Será que você poderia... Não contar para ninguém? – Pedi para ela. – Nós dois ainda estamos nos acostumando com a ideia. Eu soube há pouco tempo. E não gostaria que Heitor soubesse assim, pela boca de outra pessoa.
- Eu não vou falar. – Ela garantiu.
- Isso serve para a sua mãe também... Não quero que ela saiba. – Segui.
- Não saberá.
- Agora entende que eu não tenho nada com ele, não é mesmo? Quero a paz entre vocês e suas famílias tanto quanto você quer, Milena.
Os dois ainda estavam com as mãos juntas, desde o cumprimento.
- Eu... Vou... Ao banheiro. – Falei de repente, sabendo que sobrava na sala e na cozinha.
De repente, nossa casa ficou pequena para tantas pessoas. Ben e Tony foram conversar no quarto e deixamos Sebastian e Milena ali, na sala.
Fui para minha cama e deitei. Estava ansiosa e queria esperar para ver se Ben e Tony se resolveriam de vez e Sebastian e Milena se perdoariam.
Mas não esperei que eles demorassem tanto. Quando percebi, adormeci.
Senti alguém envolvendo meu corpo num abraço, ainda na cama.
- Me aperta com força, Heitor – pedi, ainda sonolenta. – Estou morrendo de saudade.
- Posso até apertar, mas não sou Heitor. E meu pau não vai ficar duro para você.
Despertei imediatamente e virei, percebendo que era Ben:
- Para você estar aqui... Algo não deu certo.
- Não mesmo. E quando isso acontece, eu preciso de você comigo.
- Que horas são?
- Duas da madrugada.
- O que houve?
Eu não via Ben porque as luzes estavam apagadas, mas a claridade que vinha da rua iluminava um pouco o rosto dele. Acariciei sua bochecha macia, com a pele lisa e bem cuidada.
- Ele não vai assumir o que sente. – falou, carregado de sentimentos.
- Não vai assumir para ele mesmo ou para os outros?
- Ele já conseguiu assumir para si mesmo. Mas não vai fazer isso com relação à família.
- A megera ameaçou ele?
- Sim.
- Eu achei que Tony estava preparado para assumir o que vocês sentiam um pelo outro.
- Ele me ama e não tenho dúvidas disso. Inclusive hoje ele repetiu várias vezes para mim. Ainda assim... – A voz dele falhou.
- Amor é amor. Eu não consigo entender este preconceito. A escolha dele é viver uma vida de mentiras... Para sempre?
- Infelizmente sim. E como eu já havia dito, isso não me surpreende.
- Eu sei que desta vez você realmente se apaixonou.
- Agora entende que das outras vezes não era amor? Mas agora é. Tony me tratou como nunca fui tratado por um homem a minha vida inteira. Como se ele levasse realmente a sério o que sentíamos um pelo outro. E então acontece isso... E eu me sinto completamente destruído.
Coloquei meu braço sob a cabeça dele, que se aninhou a mim:
- Não é você que perde, Ben. É ele. Jamais encontrará alguém tão especial quanto você.
- Mas dói pra caralho.
- E eu não sei? – senti meu coração quebrado pelo dele.
- E você ainda assim vai abrir mão de Heitor?
Suspirei:
- Por mais que doa dentro de mim, sim. Somos de mundos completamente diferentes, Ben. Heitor nasceu numa família milionária. Sempre teve tudo que quis. Não nem sei se ele sabe dar valor às coisas que tem. O conheço tão pouco quando a questão não é o sexo. E se ele enjoar de mim e jogar-me para escanteio, como fez com todas as outras?
- Você acha mesmo que ele pode estar insistindo tanto nesta relação porque é a primeira dificuldade que encontrou pelo caminho? Como se fosse uma questão de honra ter você?
- Sim. E se eu for só o brinquedinho que ele não conseguiu comprar?
- Ele disse que ama você.
- Jardel dizia que me amava... Disse inclusive depois de bater na minha cara uma vez – minha voz ficou fraca. – Lembro exatamente das palavras dele: “Fiz isso porque eu amo você, só você e ninguém mais. Nunca mais duvide de mim.”
- Talvez Heitor ache que você seja o brinquedinho que ele não teve. – Ben alisou meu rosto. – E ao mesmo tempo dois anos não foram suficientes para você se recuperar e acreditar no amor novamente.
- Eu acredito no amor... Eu amo Heitor, de uma forma que nunca amei ninguém. A questão é: eu não suportaria viver tudo que já vivi novamente. Jardel se drogada, Heitor bebe. E eu poderia fazer outras comparações. Mas às vezes acho que qualquer homem que aparecer na minha vida vou fazer estas comparações com ele e meu passado, entende?
- Seu medo é maior que qualquer coisa.
- Sim. Se eu for destruída novamente, não conseguirei me reerguer. Prefiro viver na minha bolha, me defendendo de tudo... Principalmente do amor.
- Mesmo que isso signifique a sua dor?
- Eu sou a mulher que tem coragem de lutar por qualquer coisa, menos pelo amor. – Sorri para mim mesma, de forma irônica.
- Eu vou ficar um tempo fora.
- Como assim? – levantei da cama, confusa.
- Você é irmã de Sebastian. Tony é o melhor amigo dele. Eu preciso me afastar de Tony, ou não vou conseguir superar isso.
Liguei a luz:
- Não posso ficar sem você, Ben e sabe disso.
- Não posso ficar olhando para Tony e saber que tudo acabou da forma que foi.
- E seu emprego? Sua vida? Nós?
- É só a porra de um emprego. “Nós” sempre existirá, afinal, não vou para sempre. É temporário. A minha vida? – Ele riu amargamente. – Se eu não for, minha vida vai ficar escura e com uma nuvem cinza com chuva na cabeça, como a sua era.
- Heitor me emprestou o sol dele – sorri, deixando uma lágrima escorrer, limpando imediatamente. Se havia uma coisa que me incomodava profundamente era quando as lágrimas vinham sem pedir permissão. – Eu posso dar um pouco do sol para você.
- Amo você, Babi. Mas preciso fazer isso.
- Eu vou junto.
- Não pode. Você encontrou seu irmão, é herdeira de uma grande empresa.
- Você e Salma são o que eu tenho de mais importante na vida. Amo Mandy, estou aprendendo a amar Sebastian, mas nada se compara ao que sinto por vocês dois. E... Eu não sei explicar isso.
Ele limpou a lágrima que escorria pela minha face, outra, teimosa e escorregadia:
- Você está no topo da minha lista, Babi, de todas as pessoas que eu amo, você é minha preferida.
- Eu vou com você, Ben. Para onde for, estarei junto.
- Vou para casa de minha mãe.
- Noriah Sul? Por que tão longe, porra?
Começamos a rir ao mesmo tempo.
- E Salma? – ele perguntou.
- Ela vai junto – afirmei. – Não vou deixá-la sozinha aqui.