Capítulo 20
2365palavras
2022-12-24 14:33
- Você a conhece? – a mulher olhou para Anon 1.
Ele assentiu, com a cabeça.
- O senhor Casanova mandou que a moça entre. – disse Anon 2.
Ela saiu da minha frente, a contragosto. Dei um sorrisinho irônico e não pude deixar de alfinetar:
- Sou íntima dos Anon’s. – Pisquei.
Entrei, acompanhada dos dois seguranças gigantescos, um de cada lado, fazendo-me sentir ainda mais baixa do que já era. Eu nem alcançava nos ombros deles.
- Ok, Anon 1 cuida do Casanova filho.
- Anon 2 do Casanova pai. Estou certa? – sorri, puxando assunto.
- Não... Eu não me chamo Anon. – disse Anon 2. – Sou Otávio.
- Me desculpe, Otávio. Segurança do senhor Casanova, isso?
Ele assentiu, com cara de poucos amigos.
- Eu reconheci você. Pois bem, encontrei a carteira do senhor Allan Casanova no elevador e vim entregar-lhe pessoalmente. Sabe como é...
- Me acompanhe, senhorita? – Anon 2 não lembrou meu nome.
- Bongiove. – Anon 1 respondeu por mim.
De que adiantava mesmo eu dizer que meu sobrenome era Novaes? O homem jurava que eu era Bongiove... E acho que ele nem sabia ao certo que era o sobrenome de John, meu ídolo da infância e adolescência. Ou será que ele achava que eu era a esposa de John Bongiove? Arregalei os olhos, na direção dele.
- Vou para perto do senhor Heitor. – Anon 1 disse para Anon 2.
- Ok. Vou levar a senhorita aqui até o senhor Allan.
Acompanhei Anon 2, que na verdade se chamava Otávio, que era muito fácil de ser confundido com o verdadeiro Anon, pois tinham a mesma altura, eram morenos e se vestiam de forma igual. A única diferença é que um tinha barba e outro não.
Atrás da porta principal tinha uma espécie de hall, com piso em mármore branco mesclado com cinza claro. Outra porta foi aberta por Anon 2 e entrei numa espécie de sala gigantesca, com uma enorme escada seguindo o mesmo tom no piso, que ligava os andares.
O ambiente era agradável, tinha lustres que pareciam valer uma fortuna e garçons vestidos de branco, com gravata borboleta, serviam os convidados, alguns sentados, outros de pé, com música clássica ao fundo, tocando em volume baixo, assim como o tom de voz dos presentes. Procurei rapidamente e não vi o aniversariante.
- Bárbara Novaes? – Ouvi a voz de Allan Casanova atrás de mim.
Virei-me e deparei com ele, elegantemente vestido, sentado na cadeira de rodas. O sorriso dele era acolhedor... E encantador.
- Boa noite, senhor. Me desculpe chegar assim... Eu nem sabia que tinha convidados. Mas encontrei sua carteira... – retirei da bolsa e entreguei a ele. – Estava no elevador. Cheguei a gritar, pedindo que vocês me esperassem para descermos juntos, mas não ouviram. Então o elevador subiu... E encontrei no chão. Pensei em deixar na recepção, mas a recepcionista do prédio não tinha cara de honesta. Então fiquei com medo de ela não entregar a carteira. Enfim... Está tudo aí. Só mexi mesmo para encontrar seu endereço. No entanto o cartão com endereço era antigo. Então achei no Google mesmo. – expliquei enquanto ele me olhava sem dizer nada, com um meio sorriso no rosto.
Quando acabei as explicações, os lábios dele se iluminaram num largo sorriso:
- Obrigada, Bárbara. Fiquei preocupado, imaginando onde eu poderia ter perdido. Não precisaria ter se dado ao trabalho de ter vindo até aqui devolver.
- Eu sei... Mas é difícil confiar em alguém hoje em dia. Eu o achei tão simpático... E realmente não sabia quem o senhor era de verdade. E também queria me desculpar por confundi-lo com o homem do RH... – levantei os ombros, envergonhada. – Quando na verdade... Era o próprio CEO, acredito eu.
Ele gargalhou:
- Eu soube na hora que começamos a conversar que você não sabia quem eu realmente era. Eu não me exibo muito na mídia hoje em dia.
- Bem... Carteira entregue. E, caso queira um conselho, não guarde todos os seus cartões num mesmo lugar. Pode usar virtualmente também. Eu mesma já tive um cartão roubado há um tempo atrás. Embora só tivesse um, foi um saco. Por sorte ainda estava bloqueado. Eu recém tinha ganhado da minha avó.
- Foi assaltada?
- Na verdade... Eu acho que fui furtada. O desgraçado levou minha bolsa com celular, dinheiro e um cartão novinho em folha.
- Que coisa horrível. Sabe quem foi?
- Infelizmente sim. Foi um prostituto que meus amigos contrataram para... Me seduzir. – falei baixinho, me abaixando próximo do ouvido dele, para que ninguém mais ouvisse.
Ele começou a rir de novo.
- Não ria, senhor Casanova. Isso é sério. Chorei por um bom tempo. Não sei se por ter sido furtada ou por meus amigos terem aprontado isso comigo. Mas não vou mais tomar seu tempo. Preciso ir.
- Está bonita, Bárbara. – Ele me observou. – Obrigada por ter perdido seu tempo vindo até aqui.
- Ah, que nada! Eu... Estava indo na padaria e... Como era no caminho, pensei: vou aproveitar e entregar a carteira. – Menti, incerta do que dizer, envergonhada.
- Você costuma ir na padaria assim? – ele riu de novo.
- Não. – Comecei a rir também. – Nem vou na padaria, nem fica para estes lados... E... Ei, o senhor sabe o que é uma padaria?
- Um lugar que se compra pães?
- Sim, acertou. – Sorri. – Eu vou agora. Me desculpe, senhor Casanova, mas eu realmente falo demais. Fiquei tanto tempo calada que um dia acordei e jurei para mim mesma que nunca mais deixaria de falar o que penso. Só que descobri que penso demais...
- Bendito seja este dia, Bárbara. E por favor, não me chame de senhor Casanova. Exijo que me chame de Allan, por favor.
- O que você está fazendo aqui?
Ouvi a voz atrás de mim, certa de quem se tratava. Tanto pelo tom como pela maneira de falar.
Virei-me e acenei:
- Boa noite, senhor Desclassificado, que manda prender moças inocentes e rouba joias antigas. – Não pude me conter ao ver o salafrário na minha frente, já imaginando ele jogando as lembranças da minha mãe no lixo.
Ele vestia terno preto e camisa branca, com gravata vermelha, destoando do traje. Os cabelos estavam bem penteados e a barba recém feita. O cheiro de perfume caro pairava no ar. E os olhos dele exalavam a raiva que ele sentia por eu estar em sua casa.
Duas mulheres se aproximaram. Uma era morena, de cabelos na altura dos ombros, lisos e olhos marrons. Usava um vestido longo preto, tomara que caia, de modelo simples. Ela tinha brincos delicados e maquiagem bem-feita. Enlaçou o braço no de Heitor Casanova e ficou a me observar.
A outra, que imediatamente me olhou dos pés a cabeça, talvez me julgando da forma como eu fiz com a secretária de Heitor Casanova, era morena e alta. Tinha um corpo esguio e a pele bem cuidada. Os cabelos escuros e lisos estavam presos num coque solto, bem feito e a maquiagem realçava seus olhos claros.
As duas tinham semelhanças, como narizes finos e bocas pequenas com lábios pouco carnudos.
- Querida, esta é Bárbara Novaes. – disse Allan Casanova, enquanto a mulher se posicionava ao lado dele. – Ela encontrou minha carteira e veio entregar.
- Boa noite, Bárbara. Sou Celine Casanova. – Apresentou-se, me entregando a mão como se fosse para eu beijar.
Segurei a ponta dos dedos dela e levei para cima e para baixo, incerta se era assim que se cumprimentava uma mulher rica.
Ele ficou observando minha mão movendo a dela e quando soltei, olhou para os próprios dedos, parecendo ficar com nojo. Meu Deus, como ela era diferente do marido. Mas certamente agora eu sabia de onde Heitor Casanova tinha herdado o jeito esnobe de ser. Mamãe Casanova não fazia questão de ser simpática.
- Ela disse isso? – Heitor riu, sarcasticamente. – E você acreditou nela, pai? – ele me olhou.
- Não estou entendendo... – olhei diretamente nos olhos dele.
- Pai, certamente esta mulher roubou a sua carteira.
- Eu não acredito que está me acusando. Está querendo o que? Me botar na cadeia de novo?
- Como assim “botá-la na cadeia de novo”? – Allan encarou o filho e depois a mim.
- Lembra a louca que falei que riscou meu carro? Foi ela.
- Explicou o que você disse antes para mim? – olhei para o Casanova pai. – Seu filho é um esnobe, metido, tarado, safado, miserável e desprezível.
- Como ousa falar isso de Heitor na nossa casa? – Celine defendeu o filho imediatamente.
- Eu... Não quero confusão. – Levantei as mãos, em sinal de paz. – Só vim devolver a carteira do senhor. – Olhei diretamente para Allan.
- Não duvido que só tenha vindo mesmo trazer a carteira, Bárbara. Mas confesso que fiquei muito curioso para saber o que realmente houve entre você e meu filho.
Olhei para Heitor, que ficou esperando minha resposta. Eu poderia dar mil explicações. Mas preferi a verdade:
- Me senti ofendida pela forma como ele me tratou na entrevista na North B. no sábado e risquei o Maserati. – Abaixei os olhos. – Ele me mandou para delegacia. Então eu paguei o prejuízo com algumas joias que eu tinha. Achei que era o suficiente. Mas não... Ele pichou a fachada do meu prédio.
- Eu? Eu não fiz isso. – Ele se defendeu.
- Certamente não fez mesmo. Mas mandou fazer.
- Querido... Você... Fez isso? – a mulher agarrada a ele estreitou os olhos, encarando-o, confusa.
- O que exatamente foi pichado da fachada, Bárbara? – Allan perguntou.
- “Louca Desclassificada”.
- Alguém além de mim deve achar você uma “louca desclassificada” e decidiu que todo mundo deveria saber. – Ele se justificou. – Mas não fui eu, senhorita Novaes. – Mentiu descaradamente.
- Heitor não faria isso. – A namorada dele garantiu, me olhando.
- Vamos parar com este assunto um tanto quanto... Ridículo. – disse Celine. – Obrigada pela carteira, Bárbara. E está liberada. Saia pela porta dos empregados, por favor.
Olhei para ela, perplexa. Eu havia entregue a carteira com todos os cartões do homem e ela me mandava sair pela porta dos fundos? E eu era louca de arrumar mais confusão ainda com os Casanova? Não.
Virei as costas quando Allan Casanova disse:
- Bárbara, não vá. Fique para apreciar a festa. Você é minha convidada.
Parei e fiquei um tempo tentando absorver as palavras dele. Então virei-me novamente e disse:
- Não, obrigada, senhor Casanova.
- Allan, por favor. – ele pediu.
- Allan... – corrigi.
- Por que “Allan”? – Celine perguntou. – Você nem conhece esta mulher.
- Bárbara é uma boa moça. Ela não sabia quem eu era quando encontrou minha carteira. E ainda assim me tratou bem, como uma pessoa normal... Como há muito tempo eu não me sentia.
- Eu posso apostar que ela mesma pegou sua carteira, só para poder vir até aqui. Porque Bárbara Novaes me persegue. – Heitor disse.
- Eu persigo você? Quem foi ao banheiro feminino atrás de mim no restaurante? Você... – apontei para ele.
- Entrou no meu espaço dentro da Babilônia... Foi atrás de mim na sede da North B...
- Sem vexame... Por Deus. – falou Celine, olhando para os lados, preocupada.
Olhei para a namorada dele. Sorri maldosamente. Vou acabar com você, Heitor Casanova.
- Eu lhe expliquei que foi um acidente aquele dia na Babilônia, senhor Casanova. Entrei sem querer no seu “puteiro”. Jamais imaginei pegar você e sua namorada... – olhei para a morena que o acompanhava, estreitando os olhos. – Fazendo...
Heitor Casanova pegou-me pelo braço, me levando quase arrastada com ele, abrindo uma porta e me colocando para dentro:
- Não! Por favor... – olhou nos meus olhos e pela primeira vez falou em tom humilde.
Ele pareceu amedrontado. Ficamos nos olhando e eu não soube o que dizer.
A porta se abriu a Allan entrou, com os olhos fixos na mão dele, que ainda segurava meu braço.
- Solte-a! agora! – Allan exigiu, em tom de voz firme.
Imediatamente Heitor me soltou. Meu braço ficou levemente avermelhado, mas não doía.
- Perdoe os maus modos do meu filho, Bárbara. Você só veio aqui me fazer um favor e é tratada desta forma.
- Pai... Eu... Acho que deve recompensar a senhorita Novaes pelo nobre gesto. – Heitor disse.
Olhei-o, certa de que estava com medo de eu contar que outra mulher estava com ele na Babilônia. Logo a namorada e a mãe dele se juntaram a nós novamente, fechando a porta de vidro detrás delas.
- Heitor, o que deu em você? Vai descer ao nível dela agora? Não sabe o seu lugar? Você é um Casanova e deve se portar como tal. – A mãe dele estava furiosa e percebi os olhos de raiva e desdém que me encararam.
- Eu não quero confusão. Desculpem qualquer coisa. Preciso ir.
- Bárbara, venha comigo, por favor. – pediu Allan.
- Preciso ir... – continuei tentando ir embora dali.
Se um Casanova era ruim de enfrentar, imagine uma manada. Não... Eu não tinha psicológico para aquilo.
E nem explicações plausíveis. Odiei Heitor Casanova e a forma como ele se portou e me tratou desde o momento que o vi pela primeira vez. E isso nunca mudaria.
- Faço questão, Bárbara. – Allan insistiu.
Fiquei incerta. Meu coração dizia que eu deveria ir. Gostei de Allan Casanova desde o primeiro momento que o vi. Mas minha mente dizia para eu ir embora de vez, porque meu sentimento pelo filho dele era exatamente o oposto.
- Se for rápido, eu fico. – falei, decidida, olhando provocantemente para Heitor.
- Garanto que não tomarei muito do seu tempo.
- Acabe logo com isso, querido! – Celine saiu, me encarando de forma que me amedrontou um pouco. – Preciso voltar para festa.
A outra garota saiu e eu estava seguindo atrás de Allan quando Heitor novamente pegou meu braço.
Olhei para os dedos quentes dele, tocando minha pele.