Capítulo 87
2003palavras
2023-02-08 10:28
Eu e Yuna descemos do carro exatamente 17 horas, o horário combinado, no ponto de encontro com Colin.
Ele já nos esperava, na porta da loja de conveniência, ansioso. Quem ia para um encontro informal com a ex, numa cidade do litoral, num calor de quase 30° usando terno e gravata? Colin.
Assim que viu, o sorriso irradiou nos lábios dele. Colin Monaghan sempre foi um homem bonito e chamava a atenção das mulheres, não só pela beleza, mas também pelo sobrenome que carregava. Poderia viver com todo luxo que o cercava de nascença, sem fazer nada da vida. Ainda assim optou por seguir a carreira que o pai projetou para ele e hoje comandava todos os negócios da família. E muito bem, por sinal.

- Que bom revê-la, Sabrina.
Dei um beijo no rosto dele e apresentei:
- Esta é Yuna, minha amiga.
Os dois apertaram as mãos, polidamente:
- É um prazer conhecê-la, Yuna.
Ela não disse nada. Típico de Yuna: sem conversa, só analisando.

- Bem... Vamos ficar por aqui? – Colin olhou para os lados, certamente pensando num lugar onde poderíamos ficar.
- Quem sabe damos uma volta e encontramos uma cafeteria ou algo do gênero? – Sugeri.
- Ótimo. – Concordou.
Ele pôs os óculos escuros e nos levou até o seu carrão importado, que valia mais que a minha casa parcelada a perder de vista.

- Colin abriu a porta da frente para mim, mas acomodei-me atrás, acompanhada de Yuna. Ele ficou confuso e sentou-se no banco do motorista, ligando o carro enquanto nos observava pelo espelho retrovisor.
Não sei exatamente o motivo, mas nunca consegui sentir ódio de Colin pelo que ele fez no dia anterior ao casamento. Talvez porque nosso passado tenha sido tranquilo e de muito carinho, apesar do que houve.
Fiquei a lembrar que compramos uma casa sem sequer perguntar o preço, pois aquilo não nos importava. Contratamos uma pessoa para decorá-la, e ele escolheu os móveis e eletrodomésticos da melhor qualidade... E em momento algum eu pensei que tudo custava dinheiro. Jamais perguntei o preço de cada item que escolhi para o lugar. Ele nunca me cobrou nada, absolutamente nada.
Rodamos por duas quadras e encontramos uma pequena cafeteria. Tinha mesas na calçada e na parte interna, a qual Colin escolheu em função do ar condicionado. O lugar era bem pequeno, mas aconchegante.
Assim que sentamos, observando o pouco movimento pelas grandes janelas envidraçadas, Colin falou:
- Não sei como você encontrou esta praia... É estranha.
- Estou morando aqui.
- Morando?
- Sim... Com Charles. Ele é o pai de Medy... E do filho que eu espero. – Pus a mão na barriga, percebendo a decepção imediata dele.
- Você... Casou?
- Não. Estamos morando juntos. Afinal, casamento não significa muito, não é mesmo?
Ele suspirou:
- O que você quer de mim, Sabrina?
- Eu quero três coisas de você, Colin: processar uma garota que jogou meu nome na lama com um vídeo, requerer minha parte por direito na J.R Recording e nas propriedades de J.R Rockfeller... E que você não siga sendo o advogado de Guilherme Bailey e Kelly contra Charles Bailey, conhecido como Charlie B.
- Charles Bailey... É... – Ele enrugou a testa.
- É ele.
- Charles... Eu nunca esqueci o nome quando você falou, anos atrás. Mas jamais pensei que pudesse ser... O homem contra o qual eu movia o processo.
- Ele é inocente... Ele só quer o filho.
- Ele foi preso por quatro anos.
- Injustamente. – Yuna meteu-se.
- Há provas contra ele... – Colin olhou para ela.
- Foi tudo armado. – Falei.
Ele balançou a cabeça, confuso:
- Não posso fazer isso.
- Você me deve isso, Colin. Pelo que me fez passar no passado...
- Você se vingou... Deixou-me na igreja.
- Não teria feito isso se você não tivesse dormido com ela.
- Eu pedi perdão.
- Não havia perdão e você sabe disso.
- Ela me manipulou.
- Eu sei disso.
- Sabe? – Ele arqueou a sobrancelha.
- Ela estava envolvida com Charles antes de eu reencontrá-lo, sendo que sabia que ele era o pai da minha filha e me procurava. Assim como foi atrás de você, naquela noite, na Babilônia, sabendo exatamente o que queria: levá-lo para cama.
- Eu... Nunca conversei com ela sobre o que houve – ele disse, ainda pensativo – Porque eu sempre soube que foi um erro. Mas jurei que ela havia se arrependido... Pois foi exatamente isso que aconteceu comigo, quando acordei e a vi nua ao meu lado. Eu... Senti vontade de gritar, em pânico. Sei que para você não há justificativa, mas eu havia bebido demais...
- Eu sei, Colin. Mas não quero tocar neste assunto de novo. Só quero que entenda que sim, você errou. Mas que ela o levou a agir assim. Creio que tudo que ela faça é com má intenção e disposta a me ferir de alguma forma. E o pior é que não entendo o motivo.
- Ciúme, inveja? Mas... Quem seria capaz de destruir a vida de outra pessoa por este tipo de sentimento?
- Mariane Rockfeller. – Yuna disse.
- Me fale sobre as duas primeiras questões: o processo contra a pessoa que mencionou e os seus direitos sobre os bens dos Rockfeller.
Expliquei a ele tudo que houve, sendo que durante este tempo tomamos três cafés e eu fui ao banheiro quatro vezes, por ter bebido além disso, duas garrafas de água.
- Por que eu? – Colin me olhou seriamente.
Mirei seu semblante firme, os olhos castanhos claros brilhantes, os óculos escuros repousando no alto da cabeça, a roupa completamente limpa e bem passada, como se ele tivesse saído da lavanderia naquele momento, então respondi:
- Porque você é melhor advogado que eu conheço.
Ele respirou fundo antes de dizer:
- Quanto à garota, vamos ter que entrar contra a família, visto que, segundo você, ela ainda não completou a maioridade. Tem as ameaças, o emprego que ela fez você perder, a exposição em público, o vídeo contendo cenas... Bem, explícitas, mostrado a todos.
- Não sei se explícitas... Porque não houve nada, entendeu?
- Mas as imagens não deixam isso claro. – Yuna me olhou.
- Não? – Colin olhou para ela.
- Não. Dá sim a entender que fizeram sexo. – Ela confirmou.
Colin escorou-se para trás na cadeira, me encarando:
- E quer eu como seu advogado contra seu pai porque sabe que isso será a pior coisa para ele, não é mesmo?
Colin era inteligente. Tentar enganá-lo era pior:
- Sim – confessei – Ser processado por você seria pior do que o valor que ele vai perder.
- Sabe que isso vai me trazer problemas com meu pai, não é mesmo?
- Não deveria. É o seu trabalho e estou pagando pelos seus serviços.
- Apesar de não se encontrarem mais com tanta frequência, meu pai tem muita estima pelo seu. E sabe que Jordan está falido.
- Como alguém consegue perder tanto dinheiro do nada? – Yuna questionou-se – E como a pessoa que se diz sem dinheiro tem tantos empregados na praia, vivendo uma vida como se a falência fosse somente boatos?
Suspirei:
- Pretendo entrar oficialmente na J.R Recording amanhã ou depois. E sim, não acho normal tudo que ele perdeu em tão pouco tempo.
- Como eu disse, ele nunca foi muito cuidadoso com o dinheiro.
- Ainda assim, Colin. Sempre foi um patrimônio gigantesco. Meu pai é conhecido no mundo inteiro.
- O que você está insinuando?
- Não estou insinuando nada... Só acho que não está certo isso.
- Vai trabalhar na J.R Recording?
- Sim. Exigi isso do meu pai. Estou desempregada, em função do que houve.
- E o fato de ela ter feito o que fez com o garoto na sala de aula... Pode trazer-lhe alguma consequência? – Yuna perguntou, preocupada.
- Não. Guilherme Bailey tem 18 anos. Se vai contra as regras da escola, o que eu tenho certeza que sim, ela foi demitida e pronto. Eu gostaria de olhar este vídeo.
- Eu não tenho ele.
- A garota deve ter e precisará mostrá-lo judicialmente.
- Eu... Não gostaria que você assistisse. – Falei, envergonhada.
- Não estou aqui como seu... Ex... Conhecido... Amigo... Afinal, o que somos? – Ele ficou confuso.
- Acho que tudo um pouco... Ex, conhecido... E amigo. – Sorri.
- Estou aqui como seu advogado, então precisarei assistir ao vídeo.
- Isso quer dizer que vai me ajudar?
Colin suspirou e bebeu o resto do café da xícara, de uma vez:
- Sim.
Toquei a mão dele, feliz:
- Obrigada, Colin.
- Eu nem sei porque estou fazendo isso... Vou arranjar complicação com meu pai.
- Yuna, pode me responder uma coisa? – Olhei para minha amiga.
- Eu? – ela ficou surpresa – O quê?
- Você gosta de beijar na boca pela manhã?
Ela enrugou a testa, confusa:
- Por que está me perguntando isso?
- Por favor, só responda. – Pus as mãos em prece, implorando.
- Não... Claro que não gosto de beijar na boca pela manhã... A não ser... Depois de escovar bem os dentes... E fazer a higiene matinal... No mínimo. – Falava com a testa enrugada, ainda desconfiada.
Olhei para Colin, que a observava, agora de forma mais atenta.
- Colin, o que acha sobre isso?
- Eu? Você está bem? – Ele tocou minha testa, procurando sinal de febre.
- Estou... É só uma discussão...
- Você sabe o que eu penso sobre isso.
- Colin não gosta também. – Sorri, olhando para Yuna.
- Meu Deus, você é pior que a sua filha de cinco anos! – Yuna levantou, brava, dirigindo-se ao banheiro.
- Você está estranha... Não era assim. – Colin me olhou.
- Amadureci... E ao mesmo tempo voltei a ser criança com minha filha. E isso é tão bom... – Comecei a rir, relaxando na cadeira.
- Eu ainda tenho as suas roupas no closet... Nunca tive coragem de tirar de lá... Será... Que você quer de volta?
Fiquei perplexa. Como assim ele deixou minhas coisas na casa por mais de cinco anos?
- Colin... Olhe para mim. Certamente nenhuma peça cabe mais. Além de eu ter engordado, estou grávida. E as roupas são antigas... Eu... Não quero. Pode doar.
- Retirá-las de lá será como matar você...
- Precisa fazer isso. – Olhei-o seriamente.
Yuna estava vindo de volta. Olhei para a rua e vi um casal sentado do lado de fora, nas mesas postas na calçada. Sim, se passaram mais de cinco anos... Mas eu os reconheci, porque a cara deles ficou gravada na minha mente, depois de tê-los visto na loja de conveniência do posto de gasolina, quando só estávamos Charles e eu, naquela fatídica madrugada. Foram eles que roubaram a carteira e o celular de “el cantante”.
O homem me encarou e percebi que também me reconheceu, pois ficou um tempo imóvel. Falou algo e a mulher olhou diretamente para mim.
- Sabrina, está tudo bem? Estou falando com você e não responde... – Yuna perguntou.
Eu levantei e o casal fez o mesmo. Enquanto me dirigia para a porta, eles correram para o carro.
- Colin, vamos atrás daquele casal. – Falei imediatamente.
- Você... Está louca?
- Não, não estou... Precisamos ir atrás deles. São ladrões... Eles roubaram as coisas de Charles... Tenho que falar com eles.
- Não, não vou fazer isso.
Passei a mão na chave do carro dele que estava sobre a mesa e saí correndo.
O que eles faziam na mesma cidade, tantos anos depois? O que fizeram das coisas de “el cantante”?
Colin pegou a chave da minha mão e tomou o lugar do motorista. Me dirigi até o banco ao lado dele e Yuna foi para o de trás.
- Colin, siga aquele carro! – Gritei enquanto ouvia o som do motor deles e a derrapada na estrada, fugindo em alta velocidade.