PONTO DE VISTA DE YUNIFER
O que Sahara disse me deixou intrigada, depois que a fusão de nossas almas se completou. Não havia entendido o que ela quis dizer sobre alguém estar me observando, quando ela mencionou ‘eles’, deveria ser mais de uma pessoa... mais um inimigo que observava cada um dos meus passos.
Mas, o aviso de Sahara parecia significar que o inimigo desta vez era perigoso... ou talvez muito mais forte que o Rei Alfa.
Não entendi por que ele disse aquelas palavras, afinal, depois que nossa alma terminasse de se fundir, eu teria acesso as memórias dela, as quais também eram minhas. No entanto, de repente, tive um mau pressentimento.
Eu me forcei a abrir meus olhos, em seguida, analise o meu redor. Ainda estava sentada no mesmo lugar que antes, mas eu estava com a cabeça enterrado em meus braços sobre a mesa.
Suspirei ao recobrar a consciência e vi os pratos diante de mim.
“Você está acordada?”
Quando levantei a cabeça, vi que Kale estava inclinado para mim e me olhava confuso.
“Estou sim.” Então, com mais uma olhada na cozinha, vi que Havoc não estava com ele.
“Onde está o seu companheiro?” A pergunta me pareceu natural, pois os eram como unha e carne... ou seria melhor dizer que Havoc era a cola que sempre grudava em Kale.
Ele era outro que se assemelhava com um cachorro, que sempre segue o dono com o rabo abanando. Foi surpreendente não ver Havoc com ele, dado a personalidade controladora dele, a qual o fazia ter Kale sempre em seu campo de visão.
Kale sorri e respondeu: “Ele está no escritório. Ele tinha muitas coisas para fazer, afinal, ele é um Alfa e estava negligenciando algumas questões por minha causa, então eu o incentivei a voltar para o trabalho.”
Assenti compreendendo o que ele queria dizer, pois meus companheiros também eram Alfas e tinham toneladas de responsabilidades. Às vezes eu os ajudava, nem que fosse um pouco.
“Por quanto tempo eu dormi?” Eu perguntei, olhando para aquele rosto amigo.
“Eu estava procurando por você, cheguei aqui a cerca de cinco minutos mais ou menos.” Kale falou sorridente.
“Ó? Há alguma fofoca que você queira me contar?” Eu perguntar sem olhar para ele, naquele momento, minha atenção estava toda na comida à minha frente.
“Ah, na verdade eu só queria perguntar se você está grávida.” Ele confessou timidamente, me olhando envergonhado.
Então, eu lhe fiz uma careta, já havia dito que não podia engravidar por causa do que eu era. Também já tinha explicado que eu poderia ficar doente ou até morrer se desse à luz a uma criança. Além disso, havia o fato da minha avó ter cortado a minha linhagem, impedindo que eu engravidasse, então por que ele estava fazendo aquela pergunta de novo?
Neste momento suspeitei dele e embora ainda estivesse um pouco confusa, permaneci calma e sem esboçar qualquer reação. Assim, evitei que qualquer vestígio de suspeita transparecesse no meu rosto enquanto continuávamos a conversa.
Havia algo de errado ali. Os batimentos do meu coração estavam descompassados e meus instintos me alertavam sobre algo estar acontecendo, portanto, não deveria baixar a guarda.
Eu precisava tomar cuidado porque alguém estava me observando, não foi isso que Sahara disse?
Então, erguei a cabeça e olhei para ‘Kale’ que permanecia inalterável. Se eu fosse uma tola, teria sido facilmente enganada e pensaria que ele era o verdadeiro Kale.
Aquilo era assustador.
“O que você está olhando?” 'Kale' perguntou enquanto sorria para mim, o que me deixou arrepiada.
Balancei a cabeça e respondi um tanto sem paciência. “Eu já te disse antes, minha linhagem foi interrompida e não posso mais engravidar. Mesmo que eu queira construir a minha própria família, poder ter filhos fofos e adoráveis, eu não posso.”
Apertei os lábios e agi como se estivesse desolada.
Contudo, ‘Kale’, parecia surpreso com a minha resposta. Era como se a informação que eu acabara de lhe dizer fosse nova, então, ele soltou um leve suspiro mantendo o sorriso nos lábios, isso o fazia se assemelhar muito a gentileza e inocência do Kale verdadeiro.
Mas, aquele ali, não era Kale, nem nunca seria.
Ainda não sabia as intenções daquela pessoa, mas com certeza não estava tramando algo bom.
O propósito dele era eu.
‘Kale’ respirou fundo enquanto me confortava. “Lamento ouvir isso... na verdade, acho que ainda não consigo acreditar que você não pode ter filhos e que sua linhagem foi interrompida. Como eu queria que vocês tivessem filhos fofos, afinal, eu não posso engravidar.”
Olhei para ele por alguns segundos, então também respirei fundo e concordei com a cabeça, indicando que havia entendido suas palavras.
“É uma pena. Meus companheiros também estavam ansiosos para termos filhos, mas depois que eu falei da possibilidade de morrer após o parto, eles imediatamente desistiram da ideia.” Eu falei sorrindo.
O que eu disse era verdade, eu também queria ter filhos. Além disso, Asher vivia me dizendo que gostaria de ter uma sobrinha com quem pudesse brincar. No fundo, não era uma má ideia ter filhos com meus companheiros.
Então, o que eu de fato sentia sobre esse assunto veio à tona, fazendo-me recuar e dar uma risada abafada.
‘Kale’, por outro lado, semicerrou os olhos e demorou alguns segundos para voltar a aparência gentil e sorridente.
“Aliás, eu não vi seus companheiros. Onde eles estão?” Ele indagou enquanto seus olhos vagavam pelos arredores, fingindo que procurava por meus companheiros.
A pergunta dele me deixou ainda mais alerta, portanto, logo recuperei minha compostura e mantive a calma e a naturalidade, eu não seria descoberta tão facilmente.
“Eles tinham um assunto importante para resolver, um favor que eu pedi para eles, por isso foram embora mais cedo, mesmo relutando em me deixarem sozinha aqui.” Eu falei despreocupada com um sorriso no rosto, mas tomando o cuidado de não revelar a localização deles e o que estavam fazendo.
Aquele homem... era perigoso. Eu podia sentir que ele era perigoso.
Além disso, Sahara havia me avisado sobre aquele homem. Em outras palavras, ele não era meu amigo, então, não podia baixar a guarda. Ele poderia me apunhalar pelas costas, se eu cometesse algum deslize.
O olhar dele parecia ser capaz de abrir um buraco no meu rosto, mas mesmo assim ele ainda tinha aquele sorriso doce nos lábios, o que era irritante.
Examinei-o por um breve momento e notei que ele tamborilava os dedos na mesa, o som ressoava pela cozinha silenciosa.
Eu engoli em seco o meu nervosismo, tentando me acalmar, não podia deixar transparecer a tensão que me envolvia.
“Eu sei que você percebeu que eu não o Kale que você conhece.” Ele falou de repente, com um tom de voz diferente.
O tom delicado tornou-se frio e cavernoso.
O sorriso gentil estampado em seu rosto se desfez. Ele desistiu daquela performance de bom moço e assumiu uma expressão fria e sem emoção ao me encarar.
Assim, foi a minha vez de parar de fingir e o fitei com frieza. “Quem é você? O que você quer de mim?”
O falso Kale deu um sorriso gélido. De repente, antes que eu pudesse reagir para me proteger, vi uma adaga afiada surgir na minha frente, quando ele me atacou.
Mas, graças aos meus reflexos rápidos, eu consegui desviar para que a adaga não atingisse o meu rosto.
Contudo, mesmo me esquivando para o lado oposto, a adaga afiada arranhou o lado esquerdo do meu rosto.
Então, senti um líquido quente escorrer e uma ardência no local do corte.
Quando o impostor estava preste a levantar a mão para tentar me esfaquear mais uma vez, uma voz familiar gritou o meu nome.
“YUNIFER!” Era a voz do verdadeiro Kale.
Olhei para onde ele estava e o vi correr com uma expressão horrorizada em minha direção.
Antes que pudesse alertá-lo e impedir que viesse até mim, pois aquele farsante estava na minha frente empunhando um adaga, o falso Kale desapareceu no ar.
Assim, ficamos apenas nós dois na sala de jantar.
Kale veio correndo e ajudou-me a levantar. Seus olhos não escondiam a sua preocupação enquanto ele me examinava de cima a baixo.
“Quem era? Como ele conseguiu entrar aqui? E por que ele se parecia comigo?” A voz de Kale estava trêmula e seus olhos aflitos quando ele viu minha bochecha.
A bochecha que fora ferida.
Suspirei impotente e lhe respondi. “Eu também não sei. De repente ele apareceu na minha frente depois que acordei, usando o seu rosto como disfarce.”
Kale franziu as sobrancelhas intrigado. “Como isso é possível? Eu não tenho nenhum irmão gêmeo!”
“Acho que não é esse o caso. Não sei como ele conseguiu se passar por você, mas... devemos aviar os Alfas imediatamente.” Eu falei com firmeza.
Ao ouvir isso, Kale assentiu em concordância.
Mas antes que eu pudesse me levantar, ele falou.
“Mas primeiro, vamos cuidar desta ferida.”