Capítulo 26
2094palavras
2023-02-05 08:16
A conversa na mesa se tornou grupal. Comentavam sobre a prova final e até mesmo sobre seus amigos e colegas de estudo.
Lucy comentou como se sentia preparada para a prova final, mas admitiu também como aquilo a deixava nervosa ao mesmo tempo.
E a julgar o comentário de todos os outros ali, estar-se nervoso para algo que definirá se ela iria ou não conseguir entrar na faculdade desejada era até mesmo normal, mas ela não podia focar toda a sua mente naquilo, então foi pensando nisso que Kimi propôs:

ㅡ Vamos à praia no domingo!
ㅡ Claro! ㅡ Jerry foi o primeiro a responder.
ㅡ Seria ótimo. ㅡ disse Ryeon logo em seguida.
Todos os três presentes à mesa olharam para Lucy, e como se realmente estivesse em uma gaiola presa, a garota encolheu-se e negou.
ㅡ Não posso.
Kimi rapidamente formou um bico entristecida no rosto, mas não quis insistir. Se Lucy disse que não podia, era porque ela realmente não podia, e Kimi não queria ser invasiva quanto ao motivo de não poder.

Porém, Ryeon sentia-se um pouco mais à vontade com Lucy para fazer perguntas agora, o que não dizia diretamente que ela responderia qualquer uma que lhe fosse feita, mas ele esperou até o momento em que tivesse sozinho com ela para que pudesse conversar um pouco. E assim, logo depois que saíram da sorveteria, Jerry se ofereceu para levar Kimi em casa, e mesmo que praticamente todos morassem no mesmo bairro, o que insistia em ir por o mesmo caminho e direção, a garota aceitou e logo Ryeon e Lucy se despediram, vendo-a caminhar de mãos dadas junto ao rapaz.
ㅡ Quer ir ao parquinho comigo? ㅡ Ryeon perguntou a ela.
Lucy assentiu, porque não desviava muito do seu caminho de volta para a casa, então caminhou ao lado de Ryeon e fez todo o trajeto em silêncio, não sentindo estranheza naquilo e aproveitou para olhar o céu.
A noite brilhava com as estrelas de modo tão forte que pareciam ser especiais.

ㅡ Quer ir ao balanço? ㅡ outra vez perguntou Ryeon, e, desta, viu a garota assentir animada.
Caminharam até o brinquedo e Lucy sentou-se lá. Ryeon pôs-se atrás dela e a empurrou de leve, apenas fazendo com que o corpo dela se movesse.
ㅡ Você quer falar algo, não quer?
Surpreendeu-se ao ouvir a garota perguntar-lhe, então deu breves passos até o balanço ao lado e sentou-se também, preferindo ficar quieto enquanto a garota continuava balançando enquanto seus pés lhe dava impulso.
Demorou até que Ryeon tomasse a devida coragem para iniciar o assunto, mas ele não a olhou quando perguntou:
ㅡ Por que você não pode ir à praia?
Lucy olhou-o sem que parasse de se balançar, e apenas suspirou quando disse:
ㅡ Porque eu realmente não posso Ryeon.
ㅡ É por causa da sua mãe?
Lucy outra vez olhou para o céu, e até mesmo perdeu-se lá, demorando a responder a Ryeon, mas quando outro suspiro deixou-lhe, ela segredou o que lhe incomodava.
ㅡ É por causa de como eu sou.
Ryeon continuava parado, e apenas olhava como a nuance de Lucy era tristonha, mesmo que parecesse tranquila.
ㅡ Acho que entendi... ㅡ respondeu baixo. ㅡ e tudo bem.
ㅡ Não... Não está tudo bem.
Ryeon viu Lucy frear os pés de modo brusco, e se atentou em seu rosto. A garota continuava olhando o céu e agora seus olhos brilhavam, iluminados pelo brilho das estrelas e também por suas lágrimas contidas.
ㅡ Eu queria poder ir, Ryeon. ㅡ falou e abaixou o olhar, fitando-o dessa vez. ㅡ queria poder não ter limites.
ㅡ Mas você não terá, um dia não terá mais limite, Lucy.
Era claro para Ryeon que Lucy falava de si mesma, tendo seu corpo como o "limite", mas ele sentia no tom de suas palavras como aquilo a maltratava, e sem que pudesse controlar, automaticamente maltratava-o também.
ㅡ Eu não consigo sequer me olhar. ㅡ confessou-o baixo, fechando os olhos e virando-se para a frente. ㅡ não consigo me sentir, e está ficando cada vez mais difícil...
ㅡ Diz por parecer Woojin ainda? ㅡ ele perguntou, mesmo que seu tom fosse incerto, repleto de medo de estar perguntando algo que a deixasse ainda pior.
ㅡ Digo por ainda enxergarem ele aqui. ㅡ falou e tornou a olhá-lo. ㅡ Eu sou uma mulher, Ryeon, mas tudo o que conseguem enxergar é ele.
ㅡ Eu não o vejo mais em você. Para ser sincero, eu sequer me lembro dele em você.
ㅡ Diz isso para tentar me deixar melhor, mas não é verdade...
ㅡ É a mais pura verdade.
E ela sorriu pequeno ao ouvir seu nome ser proferido por a voz calma e delicada de Ryeon. Seu coração, já fraco, não escondia como ficava ao ter os pequenos prazeres e naquele momento ela batia forte, tão forte que doía.
ㅡ Será que um dia eu vou conseguir me olhar e me enxergar? ㅡ perguntou, mas parecia que era mais para si do que para Ryeon.
Mas ele se ergueu, parando na frente dela e abaixando-se, apenas para fitá-la diretamente nos olhos.
ㅡ Você é linda, e eu tenho certeza que um dia olhará e enxergará o que digo.
ㅡ Meu corpo...
ㅡ Seu corpo é do jeito em como você quiser que ele seja. Estou aqui e não minto quando falo que apenas te quero ver bem. Eu realmente quero... E isso emprega em qualquer que seja a sua decisão sobre qualquer que seja o assunto.
Viu os olhos brilhantes lhe focarem e por breves segundos Ryeon se perdeu neles. Não compreendia como se sentia tão apaixonado a cada novo segundo, e não compreendia ainda mais o porquê de ter guardado aquele sentimento consigo por tanto tempo.
Quantos anos ele não perdeu? Foram muitos.
Mas agora ele a tinha consigo, e mesmo que fosse clara a partida de Lucy para outra cidade assim que ela tivesse a carta da faculdade em suas mãos, Ryeon sentia-se feliz por tê-la, e ali ele a tinha com os olhinhos brilhantes e cheios de lágrimas, atentos enquanto suas palavras tentavam fazê-la entender o quando ela era dona de si.
ㅡ Eu já ouvi Jaesun dizer que você é dona de si própria e que você é você independente de como seja ou aja, e eu concordo completamente com ele. Você pode tomar a decisão que quiser sobre si, e eu estarei apenas te apoiando... E se o que te incomoda agora é o teu corpo ou partes dele, eu te apoio ainda mais porque como eu disse, eu te quero bem.
Ryeon apenas deixava que seu coração comandasse suas palavras, e foi quando viu que apenas com um sutil piscar de olhos, Lucy deixou suas lágrimas caírem, que ele as limpou e deixou com que o silêncio outra vez tomasse conta de ambos, apenas deixando com que seus dedos amparasse-na e tentassem acalmar aquela bagunça emocional.
E mesmo envergonhada por chorar na frente dele, Lucy sentia-se um pouco mais leve, retirando um pequeno lasco do peso que estava sentindo há dias, com a angústia de ter que tocar em partes de seu corpo todos os dias e ter que chorar na maioria das vezes por se sentir ainda perdida dentro de si.
ㅡ Já está ficando tarde. ㅡ falou baixo, tornando a olhá-lo.
Ryeon assentiu e antes de se pôr de pé, selou a testa dela.
Ele ergueu a mão para que Lucy segurasse e assim ficasse de pé com mais facilidade, mas foi quando a garota já estava pronta para soltá-lo e voltar a andar apenas ao seu lado como havia feito o tempo todo, que Ryeon atreveu-se e entrelaçou de maneira forte e rápida seus dedos ali, surpreendendo-a e sorrindo ao encará-la.
ㅡ Você é linda Lucy.
E daquela forma caminharam de volta para a casa. Lucy ainda parecia cabisbaixa, pensativa demais e por vezes deixava com que uma lufada de ar demonstrasse como ela estava se sentindo.
Passaram por diversas casas e a maioria era das amigas de Sun-ha. Lucy encolheu-se quando viu que uma estava na janela e tentou força para soltar os dedos de Ryeon, mas foi quando ele afrouxou o toque e permitiu que ela largasse, que ela apenas olhou mais uma vez para a mulher e bufou, tornando a segurá-lo e aproximá-lo.
Estava realmente cansada de tudo.
E quando chegaram à residência dos Jeon, viram Jungso na garagem, com a porta aberta enquanto o capô de seu carro estava aberto.
Lucy aproveitou para adentrar por ali e apenas soltou a mão de Ryeon e sorriu pequeno antes de se despedir e ir.
Ryeon permaneceu olhando-a e sequer percebeu que era observado por outra pessoa.
ㅡ Onde estavam? ㅡ sobressaltou com o som da voz grave de Jungso.
ㅡ Estávamos tomando um sorvete. ㅡ respondeu, aproximando-se e guardou suas mãos dentro do bolso do short.
ㅡ Por que ela está daquele jeito? ㅡ semicerrou os olhos. ㅡ Vocês brigaram? Falou alguma coisa que não devia para ela?
ㅡ Não senhor. ㅡ Ryeon foi rápido em negar e suspirou encostando-se ao carro. ㅡ ela só está... Chateada com outras coisas.
ㅡ Que outras coisas?
ㅡ Coisas dela, tio... Ela parece muito frustrada com tudo...
Jungso continuou olhando Ryeon até que suspirou, encostando-se também ao carro e parando ao lado de Ryeon.
ㅡ Sabe, eu também percebi isso.
ㅡ Mesmo? ㅡ Ryeon olhou-o.
ㅡ Sim, desde que ela iniciou o tratamento correto com os hormônios que ela anda diferente. Acho que ela está ansiosa.
ㅡ Ansiosa?
ㅡ Sim. Ela iniciou a terapia e eu estive com ela, até mesmo conversei com ela sobre a mudança social e iremos em breve a um cartório para saber como precisamos agir, mas... Ela parece ansiosa, parece que ela quer que tudo isso aconteça logo, mas como infelizmente demora, ela acaba se frustrando, e eu a conheço, ela chora às vezes, o nariz dela sempre fica...
ㅡ Vermelho. ㅡ Ryeon completou sentindo-se péssimo. ㅡ eu não gosto de vê-la assim tio.
ㅡ Eu também não, filho, mas infelizmente tudo necessita de tempo e nenhum ser humano conseguiu mudá-lo ainda, então demora...
ㅡ Eu vou tentar animá-la um pouquinho. Amanhã, se o senhor permitir, a levarei para um passeio no parque, tudo bem?
Jungso sorriu e limpou as mãos sujas de óleo do motor, em seguida ergueu os olhos e viu que Ryeon esperava ansiosamente por sua resposta.
ㅡ Antes de permitir, posso te fazer uma pergunta? ㅡ Ryeon piscou um tanto assustado, porém assentiu. ㅡ Você gosta muito dela, não é?
Ryeon sorriu e até mesmo sentiu-se um pouco envergonhado, abaixando assim o seu olhar.
ㅡ Gosto demais.
ㅡ Mesmo com tudo isso?
ㅡ Principalmente por tudo isso. ㅡ Tornou a olhá-lo. ㅡ Estou apaixonado, tio...
ㅡ Talvez eu não quisesse ouvir isso agora. ㅡ sorriu e suspirou, sentindo seu coração de pai bagunçar-se. ㅡ ainda é muito novo ter um garoto na minha porta dizendo que está apaixonado pela minha filha, entende?
Ryeon riu divertido e assentiu. ㅡ Talvez eu entenda.
ㅡ Mas, para ser sincero, eu sempre desconfiei. Mesmo antes de entender tudo isso, eu via como você a olhava, e desde criança como você a protegia e até mesmo a defendia. Você é um bom rapaz.
ㅡ Então isso significa que o senhor faz gosto caso eu um dia namore-a? - perguntou acendendo-se.
ㅡ Vá com calma! ㅡ Jungso jogou-lhe o pano e foi rápido em dizer: ㅡ vá para a casa.
ㅡ Me expulsando tio?
ㅡ Não me amola, garoto, parte de mim, está um tanto bravo com a sua frase ainda.
Ryeon outra vez riu e assentiu, mas desta vez afastou-se do carro e reverenciou o homem.
ㅡ Obrigado pela breve conversa, tio Jungso, tenha uma boa noite.
ㅡ Você também, agora vá.
E ele acenou antes de virar as costas para o homem e sair. Ryeon ainda olhou a janela do quarto de Lucy e sorriu ao vê-la parada ali, talvez estivesse lhe esperando, pensou.
Ele acenou para ela e até mesmo mandou um beijo no ar, fazendo a garota sorri envergonhada enquanto acenava de volta, e Jungso tudo via encostado agora à parede, negando e sentindo a estranheza apenas aumentar.
Talvez ele não estivesse totalmente pronto para ter sua recém filha com pretendentes em sua porta, ainda mais um que lhe chama constantemente de tio e usa gírias como se fosse o abc. Mas ele sorriu ao ver o sorriso em que Ryeon carregou consigo até sumir de vista, e imaginou que Lucy carregasse um tão iluminado quanto.