Capítulo 71
1946palavras
2023-02-08 10:20
Mariane não disse nada, parecendo não entender a deixa.
- Com tantos homens, por que escolher os meus?
- Ninguém é proprietário de ninguém nesta vida, Sabrina. Achei que você já tinha percebido isso.

- Existe uma coisa que se chama amor... Você conhece?
- Claro – ela me olhou, seriamente – Eu o amo. Mas nunca tive sentimentos por Colin. Foi só uma transa de uma noite.
- E tinha que ser justo na noite antes do meu casamento? Eu gostava de Colin... Nos dávamos bem.
- Deveria ter casado com ele. Eu sugeri isso, inclusive.
- Eu não sou mais a menina ingênua que você conheceu e traiu, da pior forma possível.
- E eu não estou disposta a abrir mão de Charles por você.

Peguei o cigarro da mão dela e joguei na areia, pisoteando:
- Eu lhe contei toda minha verdade naquele dia. Estava sendo posta para fora da nossa casa com um filho no ventre. E você teve a capacidade de ir atrás do homem que eu amava, mesmo sabendo que eu estava grávida dele... E... – Engoli a saliva, tentando não chorar, incapaz de terminar a frase, tamanho asco que senti.
Mariane levantou e disse:
- Ele não vai me deixar. Me deve muito... A vida praticamente. Eu fiz dele Charlie B. Assim como o fiz brilhar, apago a luz dele em segundos e o destruo para sempre.

- Imagino que sim. Você fez bem a lição de J.R Rockfeller, sobre decidir a vida das pessoas e se achar dona delas.
- Sabrina, eu acredito que Charles não ficará muito contente ao saber que você foi demitida de seu emprego por transar com o filho dele.
Senti meu coração bater mais forte. E não foi por medo do Charles pensaria, mas pelo que “ela” sabia sobre mim o tempo que estive fora:
- Como assim? – Perguntei.
- Com direito a telão, para comprovar a putaria. Eu não quero filhos, mas se fosse mãe de Guilherme Bailey, jamais aceitaria o que você fez.
- Não quer filhos? – ri, ironicamente – Não tem sequer capacidade para ser mãe. Você é um monstro.
- Para que ter filhos? Charles já tem dois: um casal. Poderei receber as crianças nos finais de semana... E prometerei a ele que não vou deixar o filho lindo dele “me comer”.
Tentei estapeá-la, mas Mariane foi mais rápida, segurando minha mão:
- Não brinque comigo. – Ameaçou-me.
- Isso não é uma brincadeira. Tampouco uma competição. Quero você longe da minha filha... E de Gui.
- Quanta preocupação com os filhos de Charles. Sei que você cuida muito bem deles... Até demais, não é mesmo?
- Você sabe que não é um anel no seu dedo que vai fazer Charles gostar de você. Isso nunca vai acontecer.
- Por que você veio, afinal?
- Para tomar o que é meu por direito: a empresa, a casa e o seu futuro noivo. – Sorri e saí, fingindo segurança quando na verdade estava morrendo por dentro.
Quando passei pela sala, Charles estava sozinho. Assim que me viu, levantou:
- Eu... Tentei levá-la para o quarto. Mas Gui a pegou. Ela está dormindo... Como um anjo.
- Como está sua situação com ele?
- Péssima. Ele não deixa eu me aproximar. E o fato de ter você no meio dificulta tudo ainda mais.
- Aconteça o que acontecer, não esqueça do nosso plano, por favor. – Olhei para os lados, para me certificar de que ninguém nos observava.
- Não vou esquecer. Embora... Seja muito difícil. Tanto por você quanto por Medy. – Os olhos verdes pousaram sobre os meus, docemente.
Ele vestia um conjunto confortável de moletom claro e estava diferente do estilo de sempre: calças justas e jaquetas pretas. Era lindo de qualquer forma.
- Eu sinto seus olhos... Me engolirem, garotinha. – Falou baixo.
- Juro que eu gostaria muito de engolir outra coisa. – Sorri e dei uma corridinha até a escada.
- Garotinha levada... – Ele riu e deu grandes passos na minha direção enquanto eu subi as escadas rapidamente, tentando escapar.
- Charles? – Mariane o chamou.
Ficamos imóveis. Imaginei que agora eles subiriam e dormiriam na mesma cama e aquilo fez meu sangue ferver de ódio. Respirei fundo e disse:
- Boa noite, irmã. Boa noite, cunhado. – Pisquei na direção dele.
Ouvi Mariane dizendo:
- Sente aqui. Precisamos conversar.
Ele não disse nada. Mas imagino que tenha feito o que ela pediu.
Pensei em escutar o que falariam, mas não. Talvez fosse pior. O que os olhos não veem o coração não sente.
Assim que acessei o corredor, vi Guilherme parado na porta do meu quarto.
- Obrigada por botar Medy na cama.
- Falou com ela?
- Falou com ele?
- Não há o que ser dito entre nós dois.
- Há muito a ser dito, Gui. Tanto por ele quanto por você.
- Eu sinceramente não quero discutir isso com você, Sabrina.
- Ok... E eu falei com ela. Mas não o que deveria.
- Pelo visto seu “el cantante” não é tão melhor que Colin Monaghan.
Claro que tinha ciúme e ressentimento nas palavras de Guilherme. E eu deveria ter ciúme também, mas confiava tanto no amor de Charles por mim que me sentia segura, quanto à qualquer mulher que cruzasse o seu caminho. Mariane o manipulou e usou da sua sensibilidade, lhe dando fama e apoio quando ele estava completamente sozinho e destruído. Ele era grato. Nada mais. Aceitou se envolver com ela por insistência e gratidão.
- Boa noite, Gui.
Tentei passar por ele, que me pegou pelos ombros, pondo-me contra a porta, ficando com o corpo grudado ao meu.
- Gui... Não...
Ele tentou em beijar. Eu não queria ser grossa e sabia que havia sido uma péssima pessoa quando o aceitei e agora simplesmente o rejeitava porque o homem que eu amava tinha voltado. A questão é que o pai dele era o amor da minha vida e qualquer envolvimento entre nós dois tornava tudo ainda mais complicado e doloroso.
Virei o rosto para o lado e ele tentou encontrar a minha boca, mesmo eu negando, a boca selada, os lábios comprimidos.
Quando percebi, Charles estava tirando-o de cima de mim, puxando-o pela gola da camisa, deixando-nos surpresos e assustados.
- Não encoste nela. – Proferiu, em tom ameaçador ao filho.
Guilherme riu, debochadamente:
- Sinto muito, tarde demais, “papai”.
- Charles, por favor... – Pedi, tentando contê-lo.
- Não vou bater nele... Não se preocupe. Embora devesse apanhar uma surra para aprender a ser homem.
- Como você? – O garoto provocou, ainda de forma sarcástica.
- Como eu. Jamais toquei uma mulher sem que ela quisesse.
- Minha mãe era uma menina quando você a engravidou.
Charles soltou-o, dando um passo para trás, os olhos ficando tempestuosos:
- Eu tinha dezesseis anos, porra. Eu também era uma criança.
- Mas sabia como fazer crianças.
- Tanto quanto sua mãe. Éramos adolescentes... Nos gostávamos. E chegamos a tentar criar você juntos, mesmo em casa separadas.
- Nada do que vem de você é verdade.
- Nunca me deu uma chance de lhe dizer a minha verdade.
- Charles, por favor. O adulto aqui é você. Vamos encerrar isso. – Pedi.
- Está me chamando de criança agora, Sabrina?
- Não, Gui. Só estou tentando explicar-lhes que aqui não é hora nem lugar para discussões. Já é tarde e...
A porta se abriu e Melody apareceu, com os cabelos amassados e os olhinhos quase fechados. Olhou para nós e levantou os braços na minha direção, pedindo colo.
Mariane entrou no corredor, vindo na nossa direção. Não faltava mais nada.
- Eu... Estou com sono. – Melody deitou no meu ombro.
Mariane simplesmente passou os braços em torno de Charles e o levou para o quarto, trancando a porta com a chave.
No momento que ouvi o som da chave na fechadura, meu coração ficou apertado. Me vi olhando para a porta, morrendo de ciúme e imaginando o que poderia acontecer ali dentro.
- Acha que ele nunca dormiu com ela? – Gui me perguntou.
- Respeite a minha filha. – Falei, entrando no meu quarto e fechando a porta.
Pus Melody na cama e deitei ao lado dela, tentando me acalmar. Não sei o que me deixava pior: Gui tentar me beijar a força, como um moleque, ou Charles sozinho com minha irmã no quarto. Não pensei que aquilo fosse mexer tanto comigo.
- Eu quero água. – Melody disse, ainda sonolenta, sentando na cama.
Fui até o aparador e pus água da jarra no copo, entregando-lhe.
Ela bebeu tudo e devolveu o copo vazio:
- Não vá fazer xixi na cama. – Ri.
- Não... – Ela deitou de novo.
Eu deitei no travesseiro, ao lado dela e a cutuquei com meu dedo, chamando sua atenção:
- Estive pensando, docinho... Que talvez seu pai deveria cantar para você dormir.
- Mas... Ele cantou várias músicas para mim... – Ela virou para o outro lado.
- Mas teria que ser só você e ele... E uma música para dormir... Não das que ele já tenha escrito.
Ela sentou na cama num salto:
- Acha que ele faria isso?
- Eu tenho certeza que ficaria feliz. Acho que poderia fingir que é uma fã incontrolável... Ou algo do tipo. Afinal, temos o nosso segredinho. E a tia Mariane não pode saber.
- Eu não gosto dela.
- Vou te contar outro segredo: eu também não.
Nós duas começamos a rir.
- Por que papai namora ela?
- É tudo fingimento... Lembra?
- Eu acho que ela gosta do meu papai. Como Gui gosta de você.
- Isso eu também acho. Mas papai é nosso.
- Sim. – Ela pôs os braços para cima, achando engraçado e levantando.
- Onde vai? – Perguntei ao vê-la se dirigindo para a porta.
- Chamar o meu papai.
Vibrei internamente. Melody acabaria com Mariane. O sentimento de posse dela com o pai era visível. Eu só dei uma “empurradinha”.
Fiquei atrás da porta, ouvindo-a bater na porta do quarto do pai. Não demorou muito para Charles abri-la:
- Medy?
- Charlie B., pode cantar uma música para eu dormir? – Ela falou com voz doce, daquelas que ninguém conseguia negar, principalmente o papai babão.
- Claro que sim, meu anjinho.
- Sabe que horas são? – Mariane perguntou-lhe.
- Não importa que horas são... É uma fã me requisitando. E você sabe o quanto sou dedicado com as fãs. – Ele disse, pegando Melody no colo.
- Isso é sério? – Ela perguntou, furiosa.
- Podemos entrar no seu quarto, será? – Charles perguntou.
- Sim, na minha caminha. – Melody exigiu.
Corri para o banheiro, vendo os movimentos deles em direção ao quarto. Fechei a porta e liguei o chuveiro. Talvez devesse mesmo tomar um banho. Retirei a roupa e fui para baixo da água. Regulei na temperatura gelada. Não conseguia ouvi-los dali, mas imaginava que “el cantante” já estava cantando para a filha, como ela tanto sonhou, por anos. E eu prometi a mim mesma que não iria chorar. Nós duas merecíamos aquilo. Foi muito tempo esperando por ele nas nossas vidas.
Não foi proposital, mas não havia roupas limpas no banheiro, porque o banho não foi planejado. Enrolei-me numa toalha e saí, com os cabelos úmidos, depois de ter borrifado um pouco do meu perfume favorito no colo.
Abri a porta e dei de cara com Charles cantando para Melody, sentado na nossa cama.
- Eu não acredito nisso!
Vi a voz de Mariane sentada sobre uma cadeira, próxima da porta que dava para a sacada.